A lei de drogas é completamente omissa quanto as quantidades destinadas para uso e as quantidades para tráfico. Não obstante, o art. 28 ainda apresenta possível inconstitucionalidade ao elencar as sanções àqueles que adquirem, guardam, tenham etc. drogas para consumo pessoal.
A Defensoria Pública, órgão que eu muito critico desde que comecei o curso de direito e sigo criticando como advogado, dessa vez fez o correto: levou o julgamento do porte de 3g de maconha até à Suprema Corte e muito provavelmente vai ganhar esse caso. Drogas por si só, tendo como vista a ética, não deveriam levar ninguém à cadeia. No ponto de vista constitucional, o tal artigo (assim como outros infinitos artigos dispersos por todo o sistema legal brasileiro) pode violar o 5º, X, ao passo de que o consumo de substâncias não é um problema de saúde pública, mas sim uma opção da vida pessoal e íntima da pessoa, ou seja, uma conduta da esfera privada. Pense: o álcool é, dentre as drogas, a que mais mata, seja por efeitos próprios, seja pelo resultado de sua ingestão em terceiros. Ainda assim, não há qualquer debate para a sua proibição, nem mesmo pela justificativa da saúde pública.
A proibição ainda atinge esferas penais. Pensemos no princípio da proporcionalidade (que não vou me dar ao trabalho de explicar): por que penas tão graves para quem porta baixíssimas quantidades para consumo próprio? Agora, no da lesividade: qual a problemática do consumo em quantidades razoáveis, sendo que muito provavelmente apenas o próprio indivíduo vai sofrer com seus efeitos? Reiterando a comparação com o álcool, mas podendo se estender até mesmo aos medicamentos com capacidade de alterar os sentidos e a tomada de decisão do consumidor, onde que um baseado fumado ao acordar e antes de dormir vai afetar qualquer esfera que não seja a do próprio indivíduo em comparação à outras substâncias?
Os votos até então dos Ministros foram decentes, ainda que cada um tenha agido com uma arbitrariedade quase inata dos operadores do direito, principalmente no que tange quantidades (Barroso e Moraes) e substâncias (Fachin). Rosa Weber, Carmen Lúcia e Dias Toffoli provavelmente vão manter a linha, enquanto podemos esperar qualquer coisa de Nunes Marques, Mendonça e Fux.
A descriminalização do porte é uma vitória até no ponto de vista ético, mas também abraça os juspositivistas estudiosos do direito constitucional e, pensando como um consequencialista, vai diminuir muito a população carcerária, dando menos margem praqueles debates horrorosos sobre os presídios superlotados e focando a máquina judiciária aos assuntos que realmente interessam.
E que estendam também para os esteroides anabolizantes, que pra quem não sabe, tem os olhos da justiça apontados de forma ainda mais torta.