Antes de ler: Eu decidi escrever essa fic depois de passar meses vendo os desenhos impressionantes de algumas pessoas no Tumblr e finalmente indo assistir The Walking Dead.
Não tem exatamente um objetivo aqui, só são quatro garotas lutando por suas vidas. É meio tenso, então se você tiver coração fraco, não leia.
Não é um crossover, embora eu tenha pegado os elementos que fazem The Walking Dead ser um HQ e uma série tão boa e me baseado para começar a escrever.
Se gostarem ou não, mandem reviews, por favor, é a primeira vez que faço algo desse tipo então não espero nada além de pura negação. Mas... se as coisas forem o contrário, pretendo continuar e ver aonde essa fic pode levar.
Autor: Hayashi
Gêneros: Ação, Drama, Mistério, Terror, Tragédia, Universo Alternativo, Yuri, Amizade, Aventura, Horror, Romance, Suspense
Avisos: Homossexualidade, Linguagem Imprópria
13 de Março de 2012
Lima Hospital, Lima, OH
5:45 PM
— Anda Rachel, acorde! — Quinn Fabray sacudia sua antiga colega do clube de coral desesperada. — Porra, Rach, eu preciso de você aqui!
Uma lâmpada estourou acima delas. Quinn deitou-se sobre o corpo inerte de Rachel para protegê-la dos estilhaços. Os gritos vindos do lado de fora aterrorizavam a garota. Tiros também eram ouvidos. Ela voltou às inúteis tentativas de acordar Rachel Berry.
— Por favor, Rachel! Estamos sem tempo! Sabe o quanto custou fazer Santana parar aqui para te levar?! Acorde, Rachel, por favor!
Quinn sentiu o chão estremecer e mais tiros, agora muito mais perto. Ela engoliu em seco, apavorada. Estavam no corredor, pensou. A guarda estava no corredor. Isso significava que os walkers tinham se aproximado terrivelmente.
Ela olhou para a porta, que tremia devido à pressão. Sua expressão estava perdida. Ou trancava Rachel ali e saía pela janela como entrara ou esperava o exército para ser morta. Era uma decisão difícil, mas as palavras de Santana invadiram sua mente, “Faça o que der.” Querendo obrigar seu corpo a não fazer aquilo, ela encaminhou-se à janela, lançando um último olhar sofrido à Rachel.
— O que está acontecendo?
Quinn arfou. Ao voltar sua atenção à Rachel, seu coração de um salto enorme. Rachel Berry tentava sentar-se, olhando confusamente para o quarto e apalpando seu peito cheio de fios ligados aos aparelhos. Quinn deu um grito de felicidade e correu de volta à garota.
— Rachel! N-nós... Precisamos sair daqui, agora! — Quinn analisou os equipamentos que prendiam Rachel, se perguntando como levaria ela com aquele tanto de fios. — Aconteceu algo... Tem walkers para todos os lados... Santana está nos esperando do lado de fora... Droga!
Quinn chutou o aparelho que controlava a respiração de Rachel. Toda a iluminação tinha ido embora, os equipamentos do quarto também haviam se desligado. Agradeceu pelo Sol ainda não ter descido completamente e começou a desconectar os aparelhos da garota. Os rugidos dos walkers, os gritos e os tiros dos humanos começavam a perturbá-la.
— O que são walkers? — indagou Rachel, confusa pelas inúmeras informações que Quinn dera em tão pouco tempo.
— Zumbis, Rachel — respondeu a outra, tendo dificuldade com alguns adesivos no peito de Rachel. — Estamos no meio de um apocalipse zumbi. — Ela tirou o último fio que prendia a garota à cama e rapidamente a pôs em seu colo. — Vamos.
Rachel sequer questionou quando Quinn tirou uma pistola de um case na suas costas e foi em direção à janela, parando apenas para por no ombro uma mochila pesada, carregada que medicamentos que conseguira roubar ao entrar no hospital.
Quinn nunca ficou tão feliz em ter sugerido colocar a colega de coral no primeiro andar. Ela pulou a janela com facilidade, procurando seu carro que Santana estava dirigindo.
— Ah, meu Deus! — exclamou Rachel horrorizada, olhando para o lado.
Quinn xingou Santana em voz alta. O walker se aproximava ligeiramente mais rápido ao notar duas garotas vivas ali. Quinn não hesitou e atirou no morto-vivo, mirando no meio de sua testa enquanto sentia o rosto de Rachel afundar em seu peito.
Felizmente, um carro vermelho virou a esquina do hospital. Santana dirigia com um olhar psicopata; no banco do passageiro estava Brittany recarregando uma metralhadora. Quinn gritou para que elas parassem, fazendo a motorista dar um cavalo de pau. Ela abriu a porta de trás do carro, jogando Rachel sem muita cerimônia no banco, entrando rapidamente e fechando a porta, falando para Santana avançar.
Finalmente, pensou. Poderia sentir-se segura com Santana e Brittany — pelo menos por enquanto.
13 de Março de 2012
Saída Sul de Lima, OH
6:00 PM
— Devemos sair da cidade agora — decidiu Quinn uns dez minutos depois de elas terem saído do hospital. — Ouvi os caras do exército dizendo que vão isolar Lima. Se ficarmos aqui, morreremos.
Rachel continuava encolhida nos braços de Quinn, chorando e soluçando com medo. Quinn não podia culpá-la; quando aquele inferno tinha começado, sua reação fora muito pior. Acostumou-se com walkers por todos os lados. Mas ser jogada naquele mundo apocalíptico deveria horrível, mais aterrorizante que vê-lo nascer.
— Mas quando tudo isso acabar será mais fácil para o governo nos encontrar — retorquiu Santana com os olhos atentos nas ruas. Pessoas corriam ensangüentadas, walkers comiam alguns corpos que ainda gritavam; tudo hediondo demais para alguns meses atrás. Naquele dia, no entanto, era comum.
Porém, a maioria dos humanos que conseguiram sobreviver tinham o bom senso de se esconder em suas casas, de preferência no porão, e ficar lá até o dia amanhecer novamente. Os walkers começavam a dominar tudo, estava cada vez mais difícil sair à rua, tanto na noite quanto no dia.
E a situação pioraria, Quinn sabia. Tudo ficaria muito mais apavorante, o medo espalharia com mais rapidez, isso se já não tivesse sido espalhado. As quatro precisavam sair de Lima o quanto antes, arrumar um acampamento o mais longe possível de todas as cidades, viveriam por conta própria. Elas estavam sozinhas naquele mundo, era a triste verdade.
— Santana, apenas saía de Lima antes que viremos comida de zumbi — ordenou Quinn autoritária, encarando a motorista pelo retrovisor.
— Quinn está certa, San — disse Brittany antes que Santana revidasse. — Somos alvo fácil aqui dentro, principalmente agora que está escurecendo. Não podemos voltar à nossa casa, está cercada. A saída é ir embora.
Santana bufou, mas pôs o pé no acelerador, atropelando um walker distraído. Quinn deu um sorriso em agradecimento enquanto a outra apenas deu de ombros. Rachel se remexeu em meio ao abraço de Quinn e saiu dele, enxugando as lágrimas e assumindo uma postura séria.
— N-nossos pais? Nossos colegas? — perguntou, fazendo todas no carro fechar a cara. — O que houve com eles?
Santana e Brittany ficaram em silêncio, dando à Quinn a tarefa de responder àquela difícil pergunta.
— Morreram. Ou estão vagando por aí.
— C-como?
— Quando um walker te ataca, você tem que rezar para não ser mordido — explicou Quinn. — Primeiro vem a febre, depois você apaga. Morre. E “renasce” zumbi. Só um ataque certeiro na cabeça pode matá-lo.
Quinn sentiu-se culpada por ter feito Rachel voltar a chorar, mas aquele momento, o da descoberta, o de acordar e perceber que seu mundo se fora, era duro. A garota só precisava de um tempo — ou muito tempo.
— M-meus pais, Quinn? Eles morreram?
— Não — respondeu a outra. — Pelo menos eu acho que não. Hiram e Leroy foram os primeiros a saírem de Lima, prometi a eles que cuidaria de você até estar capacitada novamente. Mantínhamos contato até o governo cortar todos os meios de comunicação, há duas noites. Eu não sei onde eles estão, Rachel, lamento.
A noite chegara. Santana acendera os faróis do Cadillac no mínimo, para o caso de toparem com um walker perdido. As luzes e os gritos de Lima ficavam para trás rapidamente, o que obrigou Quinn a pedir para Santana desacelerar, para não perderem muita gasolina.
— E Finn? — Rachel voltou a perguntar, causando um rolar de olhos em Santana. Brittany cochilara no banco do passageiro. — Os garotos do Glee? Todos morreram?
Quinn suspirou, cansada. Teria que fazer Rachel dormir, mas ela não ficaria quieta sem respostas.
— No começo, todos estavam juntos. Pais, professores, membros do Glee... Depois que perdemos Mr. Schue e Coach Sylvester, as coisas desandaram. Kurt, sua família e Blaine partiram logo após seus pais. Mas também perdemos contato com eles. Finn preferiu ficar. Mike, Tina e Artie foram os próximos... Santana teve que matá-los uma semana depois, encontrou-os perto da saída da cidade, certo?
Santana assentiu, a expressão perturbada. Quinn continuou.
— Mercedes, Sam, Rory, Sugar e uma garota que a gente encontrou perdida pela cidade estavam bem e seguiram para o sul, há uns quatro dias. Planejamos encontrá-los. Ao contrário de seus pais e Kurt, nós pegamos um rádio-comunicador e entregamos a Sam. O outro está no porta-luvas do carro. Não vamos nos perder deles, disso tenho certeza.
Quinn engoliu em seco, fitando Santana pelo retrovisor. Ela sabia que faltava um aluno do coral a ser mencionado, não se esquecendo do final de outro. Respirou fundo e retomou seu relato.
— Puck é o melhor. — Quinn sorriu, lembrando-se da expressão do garoto de moicano ao deixar a casa onde se abrigavam. — Ficou para proteger Shelby e Beth, e disse que se juntaria ao nosso acampamento. Agora com o exército querendo fechar a cidade, não sei o que acontecerá com eles.
Olhou para Rachel. Os olhos dela imploravam pelo que tinha acontecido com Finn.
— Num dia, estávamos sem fralda para Beth. Puck sempre ia sozinho buscá-las, mas Finn se ofereceu para ir. — Quinn parou. Contar aquela história era pior que tê-la vivido. — Aquele idiota... Ele não voltou. Minha missão foi de procurá-lo, ver se ele precisava de ajuda com um grupo de walkers... Finn era um deles, a transformação mais rápida que já vi. Embora antes eu quisesse colocar uma bala no meio da testa dele, nunca foi tão doloroso atirar num zumbi.
Rachel não procurou os braços de Quinn ou se debulhou em lágrimas. Apenas ficou parada, deixando que o balanço do carro a encostasse na janela e lá permanecendo até cair no sono.
Quinn afagou os cabelos de Rachel, tentando confortá-la. Talvez tivesse sido melhor se tivesse deixado Rachel no hospital como Santana sugerira, pensou. Ela não pertencia àquele mundo sem sonhos, àquele apocalipse maluco. Teria que protegê-la sempre, até seu último dia, como prometera a Hiram e Leroy.
— Ela vai ficar bem — disse Santana com a voz rouca, observando Quinn. — Rachel foi jogada nesse mundo, leva-se mais tempo para nós para se acostumar.
Quinn concordou com a cabeça, ainda ressentida.
— Me pergunto o que nós seríamos se isso tudo não tivesse acontecido — murmurou.
— Ela com certeza ainda te comeria — respondeu a outra, mal contendo o riso. Quinn suspirou, Santana sempre seria Santana. — Olha para você! Essa sua pose de bad boy mata todo mundo.
Santana riu abertamente. Quinn bufou ao passar a mão nos cabelos curtos e róseos, que tinha pintado um pouco antes dos walkers dominarem o planeta. Ela não sentia falta do loiro, pois durante as primeiras semanas aquele tom rosa e sua nova postura agressiva garantiam aos colegas do Glee comida da melhor qualidade.
Suas roupas tinham mudado, também. Não usava mais sapatos vintage ou vestidos (até por que era muito trabalhoso atirar em walkers ou correr deles vestida daquela maneira), e sim tênis All Star surrado e maioria das camisetas de banda que conseguira pegar quando a loja de discos fora saqueada. Suas companheiras inseparáveis (além de Santana e Brittany) eram duas ou três camisas flanelas e uma jaqueta de couro.
Quinn sentia-se bem daquela forma. Era como se esperasse dezessete anos para surtar completamente, e quando aconteceu, um apocalipse zumbi chegou. Fora um choque para ela da mesma forma para os outros, mas Quinn sentia que tinha esperado todo aquele tempo com um vazio no peito apenas para estar pronta para aquele mundo. Sua vida já estava destruída, não era nada demais matar alguns zumbis para aliviar a tensão.
— Estamos perto de Fletcher, a mais ou menos oitenta quilômetros de Lima — anunciou Santana, checando o GPS e interrompendo os pensamentos de Quinn. — Acho melhor pararmos.
— Está mesmo muito escuro lá fora — notou Quinn, encostando o nariz na janela para tentar enxergar algo. Santana revirou os olhos. — É perigoso andar nessa escuridão, pode haver um bando de walkers por aí.
— Eu falei que deveríamos esperar até o amanhecer — sussurrou a outra, emburrada. — Mas ninguém me escuta.
Santana foi desacelerando o Cadillac até parar numa clareira no acostamento da estrada. Ela fez uma manobra, de modo que os faróis do carro iluminassem a clareira à procura de walkers. Num silêncio que ardeu os ouvidos de Quinn, elas desceram para acender uma fogueira. De acordo com o último noticiário, qualquer sinal de luz afastaria os mortos-vivos.
— Deixe-a dormir — murmurou Quinn no ouvido de Santana quando a viu querendo acordar Brittany. — Cuidamos da segurança delas hoje.
A outra assentiu, se deixando ser abraçada por Quinn e indo para perto da fogueira.
***
14 de Março de 2012
Sodom-Ballou Road North, Fletcher, OH
8:45 AM
A cabeça de Rachel doía horrivelmente. A única coisa que se lembrava era da voz de Quinn interrompendo seus sonhos intermináveis e ela tentando acordar para poder escutá-la completamente. No próximo minuto, se viu presa a fios dentro de um quarto de hospital no que Quinn chamara de um apocalipse zumbi.
Queria ter ficado nos seus sonhos. Ouvir Quinn contar quase com indiferença o que estava acontecendo fez se perguntar se ela estava sofrendo com tudo aquilo. Era um choque tremendo, ela não queria fazer parte daquele mundo, desejava ter ficado naquela cama de hospital dormindo até que aquele mundo fosse dissolvido e seu mundo — um mundo de sonhos, Broadway e New York — voltasse.
Mas pelas expectativas de Quinn e Santana, as coisas não seriam fáceis daqui pra frente, o mundo de Rachel Berry estava completamente detonado. Zumbis... Walkers, como Quinn chamara aquela aberração que tentara persegui-las ao saírem do hospital. Parecia horrivelmente impossível. Zumbis... Como aquilo tinha surgido? Como as pessoas estavam começando a aceitar e se entregar àquelas coisas?
Rachel achara as informações de Quinn vagas. Pelo jeito nem ela, com seu visual novo e estranho, de cabelos curtos e pintados de rosa, saberia responder. Queria evitar as perguntas, mas seu instinto curioso não tinha mudado e saber o que estava acontecendo ali parecia uma grande vantagem.
— Tudo bem? — indagou Quinn no banco da frente do carro, assustando Rachel. Seus olhos ardiam por causa da luz do sol invadindo tudo sem respeito, e tirando umas dores nas costas e na cabeça, sentia-se estranhamente bem. Ela assentiu para Quinn, que aumentou ainda mais seu tom preocupado. — Não precisa de nada? Tem certeza que está bem?
— Estou. — Rachel tentou levantar-se, mas bateu a cabeça na janela do Cadillac, soltando um uivo de dor. A expressão de Quinn transformou-se numa de terror e ela tentou socorrer a morena, sem realmente saber o que fazer. — Quinn, fique aí. Estou bem.
Quinn sentou novamente. Rachel só então foi notar que o carro não estava em movimento. Olhou para o lado de fora da janela e encontrou Santana e Brittany terminando de fechar um acampamento. Pela fogueira ainda fumegando, Rachel supôs que não passara muitas horas do dia.
— Estávamos esperando você acordar — disse Quinn após alguns minutos, encarando suas mãos em seu colo. — Você me parece muito frágil.
Rachel queria responder que estava mesmo frágil. Não se lembrava de nada, mas para ela estar numa cama de hospital durante o fim do mundo, deveria ter acontecido um acidente muito grave. Ela só se perguntava que acidente teria sido esse.
Era estranho. Suas memórias antigas ainda eram suas. Lembrava-se de Quinn grávida no segundo ano, de ter namorado Finn por um tempo, de Finn ter tido sua primeira vez com Santana não com ela. Lembrava-se do Glee Club, de Mr. Schue, de Shelby, de Beth, dos seus pais... A lista era longa. Contudo, sua memória não parecia ter guardado as lembranças recentes. Ela sabia que deveria ter ido ao último ano na McKinley High, mas não se lembrava de ter ido com os pais fazer a matrícula ou de ter tido um dia de aula.
E do nada, sua vida toda fora embora para ela ser jogada numa realidade alternativa totalmente aterrorizante. Tinham-se passado apenas algumas horas, mas a perspectiva de ver outro walker a encarando com aqueles olhos fundos e sem vida, desesperado por um pedaço de carne humana, era apavorante.
— Ela acordou? Ótimo, vamos logo embora. Contatei com Sam, e ele está ao redor de Nashville, e que vai parar por lá — falou Santana rapidamente, entrando no carro pelo banco do motorista e assumindo o comando. Mesmo com aquele tom, alguma coisa dizia a Rachel que Santana não era na verdade a chefe de tudo. — Se tudo der certo, chegaremos lá em dois dias.
— Empacotaram tudo? — indagou Quinn autoritária, sentando-se ao lado de Rachel para que Brittany pudesse ficar perto de Santana, que já acelerava o Cadillac para fora da clareira.
— Deixamos a fogueira de fora, se quiser saber — resmungou Santana, rolando os olhos.
Quinn bufou, mas sorriu ao olhar indagador de Rachel.
— C-como vocês conseguiram isso tudo? — ela perguntou.
— O carro era do meu avô — disse Quinn, começando a contar nos dedos. — Juntamos cinco ou seis tanques de gasolina para continuar a viagem. Sei que não é muito, mas dá para chegar a algum lugar. Comida, armamento, roupas... Pegamos tudo há dois dias para não esquecermos nada. A única coisa que faltava era medicamentos, que eu peguei quando te salvei ontem.
Rachel esboçou um sorriso em agradecimento. Mais uma vez, não se lembrava de como surgira uma amizade com Quinn. Sua última lembrança com a antiga loira fora durante o baile, onde Quinn havia perdido a coroa para Kurt e ela se dera o trabalho de ir consolá-la quando sabia que ninguém mais o faria. Contudo, Quinn ainda a desprezava de todas as formas possíveis mesmo após aquilo.
Sua curiosidade estava lhe matando para perguntar o que tinha acontecido com ela. O que a teria feito perder a memória e acordar num planeta apocalíptico. No entanto, não queria chatear as garotas — especialmente Santana e seu humor explosivo — com mais perguntas. Pelo jeito se passara muito tempo, mas as lembranças ainda estavam vivas em suas mentes. Não queria causar-lhes sofrimento desnecessário. Deixaria que as coisas fluíssem.
Santana colocou um cassete no aparelho antiquado de som do Cadillac — e Rachel ficou se perguntando aonde Quinn havia arranjado aquelas fitas —, diminuindo o clima tenso, que a morena percebeu que sempre se instalava entre as três. Quinn se ocupava em observar atentamente a beirada da estrada com uma pistola na mão direita, pronta para o ataque. Rachel não tinha certeza se a garota usaria a arma para atirar num walker dentro do carro, mas ficou quieta. Questionar aquilo só traria mais olhares mortais da motorista.
Brittany balançava a cabeça no ritmo da música, que Rachel mais tarde descobriu ser um rock dos anos 80. É claro, pensou, não teria músicas novas naquele cassete antigo. Sua expressão deprimiu-se um pouco ao perceber que não teriam músicas novas por um bom tempo.
Suspirou. Sem mais desejos ou vontades, ela se questionou o que estava fazendo ali. Seja lá o que estivesse sofrendo no hospital, queria ter ficado lá. Pelo menos continuaria sonhando, pelo menos não teria que acordar para enfrentar aquele mundo louco. Ela jamais tinha pegado numa arma, como Quinn esperava que ela se desse bem? Não, não teria jeito de sobreviver ali sem um companheiro inseparável que a protegeria de tudo.
Mal as palavras invadiram seus pensamentos e ela imaginou Finn na sua frente. Seus olhos se encheram de lágrimas. Finn Hudson era um idiota, Rachel sabia depois daquele beijo muito distante no palco das Nacionais. Mas era seu idiota, o garoto que amava. Ainda não acreditara que ele tinha se transformando numa daquelas coisas iguais à que encontrara na janela do hospital. Pensar nele como um dos walkers doía demais para Rachel, por isso ela se deixou sorrir ao ver um Finn com a jaqueta do time de futebol americano vindo em sua direção no corredor do McKinley.
— Tudo bem, Rachel? — A voz de Quinn invadiu seus ouvidos, cuidadosa e um tanto apaixonada.
Rachel saiu de seus devaneios para encontrar um sorriso bondoso de Quinn, que ela jamais tinha visto, em sua direção. Ela confirmou com a cabeça, virando o rosto para que a garota não a visse limpando seus olhos.
— Ok mesmo? — insistiu a garota, pondo a mão no ombro de Rachel. Ela achou o movimento de Quinn carinhoso e pôs sua mão em cima da dela, demonstrando apoio.
— Só estou cansada. E dolorida — acrescentou, fazendo Santana, que prestava atenção na conversa das duas, rir.
— Também pudera, você esteve anos em coma — disse.
Rachel arregalou os olhos. Quinn lançou um olhar mortal a Santana, que continuou com aquele riso zombeteiro dela na cara e que Rachel conhecia tão bem.
Suas entranhas pesavam ao perceber o que estava acontecendo consigo. Ela entrara em coma. Por alguma coisa, alguma queda, algum acidente que poderia ter sido fatal, mas não foi. Ela ficara tempos no hospital enquanto os walkers dominavam o planeta Terra de alguma forma ainda inexplicável. Seus pais quiseram levá-la, porém Quinn disse que cuidaria dela.
E ela cuidou. Tratou bem Rachel até a situação sair do controle, e ter sido obrigada a tentar uma última tentativa de acordá-la. Dando certo, arrumou tudo para ir embora e encontrar Sam e sua gangue.
O que Rachel não entendia — mais do que seus pais terem fugido sem ela, mais do que não se lembrar do acidente ou das coisas o antecederam — era como ela tinha conseguido ouvir a voz de Quinn no dia anterior, tão pedinte e desesperada. Ela simplesmente não pôde agüentar ouvir a garota daquela maneira, queria levantar e fazer Quinn sentir-se bem, ficar feliz por vê-la outra vez.
Quinn era quem mais aparecia em seus sonhos durante o coma. Sequer sabia que estava naquele estado, sequer sabia o que a tinha levado a ficar naquela situação, mas Quinn estava lá sempre. Seja durante algo completamente maluco como vigiar a porta de um teatro da Broadway para que ela se apresentasse sozinha nele ou relembrando um dos pequenos momentos que já tinham tido. Quinn era presença constante neles, mais do que seus pais ou Finn ou qualquer pessoa com quem se importava.
— Santana! — exclamou Quinn indignada, passando o braço inconscientemente pelos ombros de Rachel. A garota deu um sorriso mínimo e não se importou. — Pode fazer o favor de apenas dirigir?! Está assustando Rachel!
Quinn sorriu para ela novamente daquela forma carinhosa. Rachel tentava digerir que, por trás daquela garota mandona e forte com um visual muito bizarro, existia uma menina doce e agradável. Ela gostava daquilo.
— Você não se lembra de nada? — questionou Quinn um tempo depois, quando Santana estava distraída com a música e cantava com Brittany, animada. O tom dela estava esperançoso demais, Rachel notou. — Antes do acidente... De nada?
— Não lembro nem por que eu entrei em coma — respondeu Rachel, deixando a cabeça cair no ombro de Quinn, olhando-a sem emoção. — Quero dizer, eu só senti que precisava acordar ao ouvir sua voz, só isso. E agora estou aqui.
Ela não deixou escapar o tom amargurado. O mundo que queria permanecia entalado na garganta. A percepção cada vez mais viva de que tudo nunca voltaria ao normal continuava a fazer seu coração e sua alma doer.
— Nós vamos dar um jeito, Rachel — Quinn disse ao apertar seu ombro delicadamente. — Vamos sobreviver a este inferno, acredite.
Rachel acreditou.
***
14 de Março de 2012
Schnebly Road, Xenia, OH
10:20 AM
Santana sabia que deveria sentir pena de Rachel por ela ter sido jogada naquele ataque insano e cada vez mais presente dos walkers, mas ela não conseguia. Sua personalidade forte e durona não era compatível com uma Berry, a garota era frágil demais, artística demais para ela.
Quinn, por outro lado, adorava a imagem delicada de Rachel. Santana tinha certeza de que sua melhor amiga havia se apaixonado pelo hobbit antes mesmo de ela mesma perceber isso. Mas Quinn tinha perdido tempo demais procurando o sentido da sua vida enquanto Rachel se aproximava cada vez mais de Finn e pensava que ela era má.
Disso Santana sentia pena. Por que Quinn tinha tido todas as oportunidades do mundo para fazer um novo dia melhor para ela e Rachel, só não tivera coragem. Ficara presa no estereótipo de uma sociedade prestes a entrar em colapso. Agora que tudo fora pelos ares, ela esperava o melhor para Quinn — e o melhor dela era apenas perto de Rachel.
De qualquer maneira, ela deu um sorriso mínimo ao observar as duas no banco de trás do carro velho de Quinn. Rachel (que ainda parecia doente, mas felizmente consciente de tudo que acontecia ao seu redor) deitava no colo de Quinn, enquanto a outra acariciava seus cabelos negros descontraidamente, parecendo lembrar à Santana aquela garota loira e certinha de poucos meses antes.
O fato de Rachel não se lembrar de nada do que tinha acontecido com ela preocupava Santana. Não por ela, já que não tinha nada a ver com aquela novela, e sim por causa de Quinn. Tinha trabalhado duro para poder ser vista como outra pessoa — uma pessoa melhor — para Rachel, que para Santana, vê-la desmoronar após o ocorrido e todas as transformações na sociedade era um tanto torturador.
— Britt, informações — pediu Quinn uns minutos mais tarde, ainda olhando para Rachel apaixonadamente.
Santana deu um olhar rápido à Brittany. A loira sorriu para ela, e a garota achou que poderia enfrentar um milhão de walkers naquele dia. Brittany era a melhor coisa que a sua vida miserável em Lima Heights poderia ter lhe dado. Ela era linda, inocente, a coisa mais pura e sensível dentro do mundo de merda em que se encontravam. Brittany era perfeita para ela, a garota mais inteligente do mundo.
— Estamos perto de Spring Valley — disse Brittany olhando o GPS, também verificando num mapa. — Santana, eu vou te dar o comando para nós não irmos pelas rodovias principais.
Aquela idéia genial tinha sido de Quinn, durante a arrumação para a fuga. De acordo com ela, seria mais fácil e teria menos trânsito se fossem por áreas suburbanas. Quanto menos interestaduais pegassem, melhor. Não enfrentariam walkers ou pessoas desesperadas em busca de ajuda.
Embora Santana não concordasse com Quinn, tinha que obedecê-la. Ela não gostava de ser comandada, mas Quinn e sua aura poderosa desde os tempos de Cheerios lideravam cada lugar que passavam. Seria quase impossível bater de frente com ela.
Quinn tinha o faro para aquelas coisas, algo que Santana jamais teria. Ela poderia ter crescido numa região não muito favorável de Lima, ter descoberto que seu nome verdadeiro era Santana aos seis anos de idade e ter arranjado encrenca com qualquer pessoa que se metesse com suas amigas e Brittany, mas Quinn possuía uma coisa muito mais que isso.
Ela transbordava poder. Olhar nos olhos da garota punk que ela havia se tornado — sem conhecê-la por muito tempo — poderia ser fatal. Santana e os sobreviventes do Glee sabiam o que ela era de verdade: uma pessoa doce e amável. Mas você não deveria se meter no caminho de Quinn Fabray sem esperar nada além do sofrimento eterno.
— Próxima parada? — perguntou Quinn, atenta.
— Daqui a cem quilômetros, o que deve levar uma hora mais ou menos — informou Brittany, diminuindo o volume do rock que Santana havia deixado tocar.
Brittany permaneceu quieta. Santana desviou o olhar por um segundo da estrada para observá-la. Todos poderiam achá-la uma vadia, mas quando se tratava da namorada, Santana sabia ser a pessoa mais meiga do mundo. Ela conhecia cada detalhe de Brittany, tanto corporal quanto psicológico, e aquela garota ao seu lado estava escondendo alguma coisa, sentia.
— O que foi? — questionou Santana, dando um sorrisinho de lado para a loira.
— Nada — Brittany respondeu, os olhos perturbados vidrados na janela do carro. — Vire ali, ok?
Santana fez o que a garota pedia, indo parar numa estradinha de terra com um engarrafamento. Ela ergueu os olhos para Quinn, que fez uma expressão confusa e mandou Rachel levantar de seu colo. Ela e Santana se entreolharam, decidindo silenciosamente o que deveriam fazer.
— Não está andando — observou Santana, colocando a cabeça para fora do Cadillac, vendo alguns carros com aparência abandonada no percurso. — Vamos dar meia volta, achar outro caminho.
Ela pisou na marcha ré, porém antes que o carro voltasse a andar, um walker apareceu misteriosamente no capô do Cadillac, fazendo Rachel dar um grito assustado e Brittany rapidamente sacar sua pistola. Ela ignorou as ordens de Quinn sobre não atacar um zumbi com uma arma de fogo e deu um tiro certeiro na cabeça do morto-vivo.
Como se tivessem dormindo, mais walkers saíram de seus esconderijos e caminhavam de sua forma lenta, porém perigosa, em direção ao Cadillac. Santana não hesitou em enfiar completamente o pé no pedal e sair da estradinha de terra cantando pneus.
— Espere! — gritou Quinn quando Santana mudou a marcha para acelerar o carro.
— Quinn, ficou maluca, estamos no meio de algo aqui! — revidou a morena também aos gritos, irritada com a atitude nada maligna da amiga naquele momento.
— Não, Santana, olhe!
Santana fechou o vidro da sua janela e aconselhou a Brittany fazer o mesmo. Ela lançou um olhar temeroso à massa de zumbis que saía da estrada, liderados por dois extremamente bem arrumados para serem walkers. Em sua forma humana, eles deveriam ter sido gays ou...
O coração da garota parou por um segundo. Ela reconhecia a gravata de um deles. Conhecia o blazer rasgado dele. Reconheceu as botas desbotadas que o outro estava usando. Percebeu até os poucos tufos de cabelo engomado que os dois usavam. Ela comprimiu os lábios, controlando suas lágrimas.
Kurt e Blaine.
Aqueles eram Kurt e Blaine.
Mas não pareciam em nada os garotos que Santana conhecia. A pele deles estava sem cor, magra e faltando em vários lugares, onde era visível a carne, inclusive os ossos. Os olhos fundos e vermelhos estavam famintos e a boca pingava sangue, dando a impressão que eles tinham acabado de se alimentar.
No entanto, walkers jamais estavam completamente satisfeitos. Eles seguiam na direção do Cadillac, gemendo e urrando como animais, à procura de mais comida, de humanos novinhos em folha para se tornarem mais deles.
Ela ouviu Brittany gritando no seu ouvido para que acelerasse o Cadillac, mas ela não conseguiu. Não poderia deixar Kurt e Blaine — os zumbis Kurt e Blaine, tinha de se lembrar — ali. Não, seria errado. Já havia passado por isso com Tina, Mike e Artie, ela não queria ver as pessoas que mais amava no mundo sofrer terrivelmente. Não queria vê-las mortas.
Então, pegou a pistola que Brittany ainda segurava e desceu o vidro do carro. Sua mira melhorara muito durante as semanas que se passavam. Duas balas bastaram para tirar Kurt e Blaine em definitivo daquele mundo apocalíptico. Pisou no acelerador, atropelando vários walkers enquanto as lágrimas desciam sem controle.
Não tem exatamente um objetivo aqui, só são quatro garotas lutando por suas vidas. É meio tenso, então se você tiver coração fraco, não leia.
Não é um crossover, embora eu tenha pegado os elementos que fazem The Walking Dead ser um HQ e uma série tão boa e me baseado para começar a escrever.
Se gostarem ou não, mandem reviews, por favor, é a primeira vez que faço algo desse tipo então não espero nada além de pura negação. Mas... se as coisas forem o contrário, pretendo continuar e ver aonde essa fic pode levar.
Autor: Hayashi
Gêneros: Ação, Drama, Mistério, Terror, Tragédia, Universo Alternativo, Yuri, Amizade, Aventura, Horror, Romance, Suspense
Avisos: Homossexualidade, Linguagem Imprópria
Capítulo 1 - Running From Death
13 de Março de 2012
Lima Hospital, Lima, OH
5:45 PM
— Anda Rachel, acorde! — Quinn Fabray sacudia sua antiga colega do clube de coral desesperada. — Porra, Rach, eu preciso de você aqui!
Uma lâmpada estourou acima delas. Quinn deitou-se sobre o corpo inerte de Rachel para protegê-la dos estilhaços. Os gritos vindos do lado de fora aterrorizavam a garota. Tiros também eram ouvidos. Ela voltou às inúteis tentativas de acordar Rachel Berry.
— Por favor, Rachel! Estamos sem tempo! Sabe o quanto custou fazer Santana parar aqui para te levar?! Acorde, Rachel, por favor!
Quinn sentiu o chão estremecer e mais tiros, agora muito mais perto. Ela engoliu em seco, apavorada. Estavam no corredor, pensou. A guarda estava no corredor. Isso significava que os walkers tinham se aproximado terrivelmente.
Ela olhou para a porta, que tremia devido à pressão. Sua expressão estava perdida. Ou trancava Rachel ali e saía pela janela como entrara ou esperava o exército para ser morta. Era uma decisão difícil, mas as palavras de Santana invadiram sua mente, “Faça o que der.” Querendo obrigar seu corpo a não fazer aquilo, ela encaminhou-se à janela, lançando um último olhar sofrido à Rachel.
— O que está acontecendo?
Quinn arfou. Ao voltar sua atenção à Rachel, seu coração de um salto enorme. Rachel Berry tentava sentar-se, olhando confusamente para o quarto e apalpando seu peito cheio de fios ligados aos aparelhos. Quinn deu um grito de felicidade e correu de volta à garota.
— Rachel! N-nós... Precisamos sair daqui, agora! — Quinn analisou os equipamentos que prendiam Rachel, se perguntando como levaria ela com aquele tanto de fios. — Aconteceu algo... Tem walkers para todos os lados... Santana está nos esperando do lado de fora... Droga!
Quinn chutou o aparelho que controlava a respiração de Rachel. Toda a iluminação tinha ido embora, os equipamentos do quarto também haviam se desligado. Agradeceu pelo Sol ainda não ter descido completamente e começou a desconectar os aparelhos da garota. Os rugidos dos walkers, os gritos e os tiros dos humanos começavam a perturbá-la.
— O que são walkers? — indagou Rachel, confusa pelas inúmeras informações que Quinn dera em tão pouco tempo.
— Zumbis, Rachel — respondeu a outra, tendo dificuldade com alguns adesivos no peito de Rachel. — Estamos no meio de um apocalipse zumbi. — Ela tirou o último fio que prendia a garota à cama e rapidamente a pôs em seu colo. — Vamos.
Rachel sequer questionou quando Quinn tirou uma pistola de um case na suas costas e foi em direção à janela, parando apenas para por no ombro uma mochila pesada, carregada que medicamentos que conseguira roubar ao entrar no hospital.
Quinn nunca ficou tão feliz em ter sugerido colocar a colega de coral no primeiro andar. Ela pulou a janela com facilidade, procurando seu carro que Santana estava dirigindo.
— Ah, meu Deus! — exclamou Rachel horrorizada, olhando para o lado.
Quinn xingou Santana em voz alta. O walker se aproximava ligeiramente mais rápido ao notar duas garotas vivas ali. Quinn não hesitou e atirou no morto-vivo, mirando no meio de sua testa enquanto sentia o rosto de Rachel afundar em seu peito.
Felizmente, um carro vermelho virou a esquina do hospital. Santana dirigia com um olhar psicopata; no banco do passageiro estava Brittany recarregando uma metralhadora. Quinn gritou para que elas parassem, fazendo a motorista dar um cavalo de pau. Ela abriu a porta de trás do carro, jogando Rachel sem muita cerimônia no banco, entrando rapidamente e fechando a porta, falando para Santana avançar.
Finalmente, pensou. Poderia sentir-se segura com Santana e Brittany — pelo menos por enquanto.
13 de Março de 2012
Saída Sul de Lima, OH
6:00 PM
— Devemos sair da cidade agora — decidiu Quinn uns dez minutos depois de elas terem saído do hospital. — Ouvi os caras do exército dizendo que vão isolar Lima. Se ficarmos aqui, morreremos.
Rachel continuava encolhida nos braços de Quinn, chorando e soluçando com medo. Quinn não podia culpá-la; quando aquele inferno tinha começado, sua reação fora muito pior. Acostumou-se com walkers por todos os lados. Mas ser jogada naquele mundo apocalíptico deveria horrível, mais aterrorizante que vê-lo nascer.
— Mas quando tudo isso acabar será mais fácil para o governo nos encontrar — retorquiu Santana com os olhos atentos nas ruas. Pessoas corriam ensangüentadas, walkers comiam alguns corpos que ainda gritavam; tudo hediondo demais para alguns meses atrás. Naquele dia, no entanto, era comum.
Porém, a maioria dos humanos que conseguiram sobreviver tinham o bom senso de se esconder em suas casas, de preferência no porão, e ficar lá até o dia amanhecer novamente. Os walkers começavam a dominar tudo, estava cada vez mais difícil sair à rua, tanto na noite quanto no dia.
E a situação pioraria, Quinn sabia. Tudo ficaria muito mais apavorante, o medo espalharia com mais rapidez, isso se já não tivesse sido espalhado. As quatro precisavam sair de Lima o quanto antes, arrumar um acampamento o mais longe possível de todas as cidades, viveriam por conta própria. Elas estavam sozinhas naquele mundo, era a triste verdade.
— Santana, apenas saía de Lima antes que viremos comida de zumbi — ordenou Quinn autoritária, encarando a motorista pelo retrovisor.
— Quinn está certa, San — disse Brittany antes que Santana revidasse. — Somos alvo fácil aqui dentro, principalmente agora que está escurecendo. Não podemos voltar à nossa casa, está cercada. A saída é ir embora.
Santana bufou, mas pôs o pé no acelerador, atropelando um walker distraído. Quinn deu um sorriso em agradecimento enquanto a outra apenas deu de ombros. Rachel se remexeu em meio ao abraço de Quinn e saiu dele, enxugando as lágrimas e assumindo uma postura séria.
— N-nossos pais? Nossos colegas? — perguntou, fazendo todas no carro fechar a cara. — O que houve com eles?
Santana e Brittany ficaram em silêncio, dando à Quinn a tarefa de responder àquela difícil pergunta.
— Morreram. Ou estão vagando por aí.
— C-como?
— Quando um walker te ataca, você tem que rezar para não ser mordido — explicou Quinn. — Primeiro vem a febre, depois você apaga. Morre. E “renasce” zumbi. Só um ataque certeiro na cabeça pode matá-lo.
Quinn sentiu-se culpada por ter feito Rachel voltar a chorar, mas aquele momento, o da descoberta, o de acordar e perceber que seu mundo se fora, era duro. A garota só precisava de um tempo — ou muito tempo.
— M-meus pais, Quinn? Eles morreram?
— Não — respondeu a outra. — Pelo menos eu acho que não. Hiram e Leroy foram os primeiros a saírem de Lima, prometi a eles que cuidaria de você até estar capacitada novamente. Mantínhamos contato até o governo cortar todos os meios de comunicação, há duas noites. Eu não sei onde eles estão, Rachel, lamento.
A noite chegara. Santana acendera os faróis do Cadillac no mínimo, para o caso de toparem com um walker perdido. As luzes e os gritos de Lima ficavam para trás rapidamente, o que obrigou Quinn a pedir para Santana desacelerar, para não perderem muita gasolina.
— E Finn? — Rachel voltou a perguntar, causando um rolar de olhos em Santana. Brittany cochilara no banco do passageiro. — Os garotos do Glee? Todos morreram?
Quinn suspirou, cansada. Teria que fazer Rachel dormir, mas ela não ficaria quieta sem respostas.
— No começo, todos estavam juntos. Pais, professores, membros do Glee... Depois que perdemos Mr. Schue e Coach Sylvester, as coisas desandaram. Kurt, sua família e Blaine partiram logo após seus pais. Mas também perdemos contato com eles. Finn preferiu ficar. Mike, Tina e Artie foram os próximos... Santana teve que matá-los uma semana depois, encontrou-os perto da saída da cidade, certo?
Santana assentiu, a expressão perturbada. Quinn continuou.
— Mercedes, Sam, Rory, Sugar e uma garota que a gente encontrou perdida pela cidade estavam bem e seguiram para o sul, há uns quatro dias. Planejamos encontrá-los. Ao contrário de seus pais e Kurt, nós pegamos um rádio-comunicador e entregamos a Sam. O outro está no porta-luvas do carro. Não vamos nos perder deles, disso tenho certeza.
Quinn engoliu em seco, fitando Santana pelo retrovisor. Ela sabia que faltava um aluno do coral a ser mencionado, não se esquecendo do final de outro. Respirou fundo e retomou seu relato.
— Puck é o melhor. — Quinn sorriu, lembrando-se da expressão do garoto de moicano ao deixar a casa onde se abrigavam. — Ficou para proteger Shelby e Beth, e disse que se juntaria ao nosso acampamento. Agora com o exército querendo fechar a cidade, não sei o que acontecerá com eles.
Olhou para Rachel. Os olhos dela imploravam pelo que tinha acontecido com Finn.
— Num dia, estávamos sem fralda para Beth. Puck sempre ia sozinho buscá-las, mas Finn se ofereceu para ir. — Quinn parou. Contar aquela história era pior que tê-la vivido. — Aquele idiota... Ele não voltou. Minha missão foi de procurá-lo, ver se ele precisava de ajuda com um grupo de walkers... Finn era um deles, a transformação mais rápida que já vi. Embora antes eu quisesse colocar uma bala no meio da testa dele, nunca foi tão doloroso atirar num zumbi.
Rachel não procurou os braços de Quinn ou se debulhou em lágrimas. Apenas ficou parada, deixando que o balanço do carro a encostasse na janela e lá permanecendo até cair no sono.
Quinn afagou os cabelos de Rachel, tentando confortá-la. Talvez tivesse sido melhor se tivesse deixado Rachel no hospital como Santana sugerira, pensou. Ela não pertencia àquele mundo sem sonhos, àquele apocalipse maluco. Teria que protegê-la sempre, até seu último dia, como prometera a Hiram e Leroy.
— Ela vai ficar bem — disse Santana com a voz rouca, observando Quinn. — Rachel foi jogada nesse mundo, leva-se mais tempo para nós para se acostumar.
Quinn concordou com a cabeça, ainda ressentida.
— Me pergunto o que nós seríamos se isso tudo não tivesse acontecido — murmurou.
— Ela com certeza ainda te comeria — respondeu a outra, mal contendo o riso. Quinn suspirou, Santana sempre seria Santana. — Olha para você! Essa sua pose de bad boy mata todo mundo.
Santana riu abertamente. Quinn bufou ao passar a mão nos cabelos curtos e róseos, que tinha pintado um pouco antes dos walkers dominarem o planeta. Ela não sentia falta do loiro, pois durante as primeiras semanas aquele tom rosa e sua nova postura agressiva garantiam aos colegas do Glee comida da melhor qualidade.
Suas roupas tinham mudado, também. Não usava mais sapatos vintage ou vestidos (até por que era muito trabalhoso atirar em walkers ou correr deles vestida daquela maneira), e sim tênis All Star surrado e maioria das camisetas de banda que conseguira pegar quando a loja de discos fora saqueada. Suas companheiras inseparáveis (além de Santana e Brittany) eram duas ou três camisas flanelas e uma jaqueta de couro.
Quinn sentia-se bem daquela forma. Era como se esperasse dezessete anos para surtar completamente, e quando aconteceu, um apocalipse zumbi chegou. Fora um choque para ela da mesma forma para os outros, mas Quinn sentia que tinha esperado todo aquele tempo com um vazio no peito apenas para estar pronta para aquele mundo. Sua vida já estava destruída, não era nada demais matar alguns zumbis para aliviar a tensão.
— Estamos perto de Fletcher, a mais ou menos oitenta quilômetros de Lima — anunciou Santana, checando o GPS e interrompendo os pensamentos de Quinn. — Acho melhor pararmos.
— Está mesmo muito escuro lá fora — notou Quinn, encostando o nariz na janela para tentar enxergar algo. Santana revirou os olhos. — É perigoso andar nessa escuridão, pode haver um bando de walkers por aí.
— Eu falei que deveríamos esperar até o amanhecer — sussurrou a outra, emburrada. — Mas ninguém me escuta.
Santana foi desacelerando o Cadillac até parar numa clareira no acostamento da estrada. Ela fez uma manobra, de modo que os faróis do carro iluminassem a clareira à procura de walkers. Num silêncio que ardeu os ouvidos de Quinn, elas desceram para acender uma fogueira. De acordo com o último noticiário, qualquer sinal de luz afastaria os mortos-vivos.
— Deixe-a dormir — murmurou Quinn no ouvido de Santana quando a viu querendo acordar Brittany. — Cuidamos da segurança delas hoje.
A outra assentiu, se deixando ser abraçada por Quinn e indo para perto da fogueira.
***
14 de Março de 2012
Sodom-Ballou Road North, Fletcher, OH
8:45 AM
A cabeça de Rachel doía horrivelmente. A única coisa que se lembrava era da voz de Quinn interrompendo seus sonhos intermináveis e ela tentando acordar para poder escutá-la completamente. No próximo minuto, se viu presa a fios dentro de um quarto de hospital no que Quinn chamara de um apocalipse zumbi.
Queria ter ficado nos seus sonhos. Ouvir Quinn contar quase com indiferença o que estava acontecendo fez se perguntar se ela estava sofrendo com tudo aquilo. Era um choque tremendo, ela não queria fazer parte daquele mundo, desejava ter ficado naquela cama de hospital dormindo até que aquele mundo fosse dissolvido e seu mundo — um mundo de sonhos, Broadway e New York — voltasse.
Mas pelas expectativas de Quinn e Santana, as coisas não seriam fáceis daqui pra frente, o mundo de Rachel Berry estava completamente detonado. Zumbis... Walkers, como Quinn chamara aquela aberração que tentara persegui-las ao saírem do hospital. Parecia horrivelmente impossível. Zumbis... Como aquilo tinha surgido? Como as pessoas estavam começando a aceitar e se entregar àquelas coisas?
Rachel achara as informações de Quinn vagas. Pelo jeito nem ela, com seu visual novo e estranho, de cabelos curtos e pintados de rosa, saberia responder. Queria evitar as perguntas, mas seu instinto curioso não tinha mudado e saber o que estava acontecendo ali parecia uma grande vantagem.
— Tudo bem? — indagou Quinn no banco da frente do carro, assustando Rachel. Seus olhos ardiam por causa da luz do sol invadindo tudo sem respeito, e tirando umas dores nas costas e na cabeça, sentia-se estranhamente bem. Ela assentiu para Quinn, que aumentou ainda mais seu tom preocupado. — Não precisa de nada? Tem certeza que está bem?
— Estou. — Rachel tentou levantar-se, mas bateu a cabeça na janela do Cadillac, soltando um uivo de dor. A expressão de Quinn transformou-se numa de terror e ela tentou socorrer a morena, sem realmente saber o que fazer. — Quinn, fique aí. Estou bem.
Quinn sentou novamente. Rachel só então foi notar que o carro não estava em movimento. Olhou para o lado de fora da janela e encontrou Santana e Brittany terminando de fechar um acampamento. Pela fogueira ainda fumegando, Rachel supôs que não passara muitas horas do dia.
— Estávamos esperando você acordar — disse Quinn após alguns minutos, encarando suas mãos em seu colo. — Você me parece muito frágil.
Rachel queria responder que estava mesmo frágil. Não se lembrava de nada, mas para ela estar numa cama de hospital durante o fim do mundo, deveria ter acontecido um acidente muito grave. Ela só se perguntava que acidente teria sido esse.
Era estranho. Suas memórias antigas ainda eram suas. Lembrava-se de Quinn grávida no segundo ano, de ter namorado Finn por um tempo, de Finn ter tido sua primeira vez com Santana não com ela. Lembrava-se do Glee Club, de Mr. Schue, de Shelby, de Beth, dos seus pais... A lista era longa. Contudo, sua memória não parecia ter guardado as lembranças recentes. Ela sabia que deveria ter ido ao último ano na McKinley High, mas não se lembrava de ter ido com os pais fazer a matrícula ou de ter tido um dia de aula.
E do nada, sua vida toda fora embora para ela ser jogada numa realidade alternativa totalmente aterrorizante. Tinham-se passado apenas algumas horas, mas a perspectiva de ver outro walker a encarando com aqueles olhos fundos e sem vida, desesperado por um pedaço de carne humana, era apavorante.
— Ela acordou? Ótimo, vamos logo embora. Contatei com Sam, e ele está ao redor de Nashville, e que vai parar por lá — falou Santana rapidamente, entrando no carro pelo banco do motorista e assumindo o comando. Mesmo com aquele tom, alguma coisa dizia a Rachel que Santana não era na verdade a chefe de tudo. — Se tudo der certo, chegaremos lá em dois dias.
— Empacotaram tudo? — indagou Quinn autoritária, sentando-se ao lado de Rachel para que Brittany pudesse ficar perto de Santana, que já acelerava o Cadillac para fora da clareira.
— Deixamos a fogueira de fora, se quiser saber — resmungou Santana, rolando os olhos.
Quinn bufou, mas sorriu ao olhar indagador de Rachel.
— C-como vocês conseguiram isso tudo? — ela perguntou.
— O carro era do meu avô — disse Quinn, começando a contar nos dedos. — Juntamos cinco ou seis tanques de gasolina para continuar a viagem. Sei que não é muito, mas dá para chegar a algum lugar. Comida, armamento, roupas... Pegamos tudo há dois dias para não esquecermos nada. A única coisa que faltava era medicamentos, que eu peguei quando te salvei ontem.
Rachel esboçou um sorriso em agradecimento. Mais uma vez, não se lembrava de como surgira uma amizade com Quinn. Sua última lembrança com a antiga loira fora durante o baile, onde Quinn havia perdido a coroa para Kurt e ela se dera o trabalho de ir consolá-la quando sabia que ninguém mais o faria. Contudo, Quinn ainda a desprezava de todas as formas possíveis mesmo após aquilo.
Sua curiosidade estava lhe matando para perguntar o que tinha acontecido com ela. O que a teria feito perder a memória e acordar num planeta apocalíptico. No entanto, não queria chatear as garotas — especialmente Santana e seu humor explosivo — com mais perguntas. Pelo jeito se passara muito tempo, mas as lembranças ainda estavam vivas em suas mentes. Não queria causar-lhes sofrimento desnecessário. Deixaria que as coisas fluíssem.
Santana colocou um cassete no aparelho antiquado de som do Cadillac — e Rachel ficou se perguntando aonde Quinn havia arranjado aquelas fitas —, diminuindo o clima tenso, que a morena percebeu que sempre se instalava entre as três. Quinn se ocupava em observar atentamente a beirada da estrada com uma pistola na mão direita, pronta para o ataque. Rachel não tinha certeza se a garota usaria a arma para atirar num walker dentro do carro, mas ficou quieta. Questionar aquilo só traria mais olhares mortais da motorista.
Brittany balançava a cabeça no ritmo da música, que Rachel mais tarde descobriu ser um rock dos anos 80. É claro, pensou, não teria músicas novas naquele cassete antigo. Sua expressão deprimiu-se um pouco ao perceber que não teriam músicas novas por um bom tempo.
Suspirou. Sem mais desejos ou vontades, ela se questionou o que estava fazendo ali. Seja lá o que estivesse sofrendo no hospital, queria ter ficado lá. Pelo menos continuaria sonhando, pelo menos não teria que acordar para enfrentar aquele mundo louco. Ela jamais tinha pegado numa arma, como Quinn esperava que ela se desse bem? Não, não teria jeito de sobreviver ali sem um companheiro inseparável que a protegeria de tudo.
Mal as palavras invadiram seus pensamentos e ela imaginou Finn na sua frente. Seus olhos se encheram de lágrimas. Finn Hudson era um idiota, Rachel sabia depois daquele beijo muito distante no palco das Nacionais. Mas era seu idiota, o garoto que amava. Ainda não acreditara que ele tinha se transformando numa daquelas coisas iguais à que encontrara na janela do hospital. Pensar nele como um dos walkers doía demais para Rachel, por isso ela se deixou sorrir ao ver um Finn com a jaqueta do time de futebol americano vindo em sua direção no corredor do McKinley.
— Tudo bem, Rachel? — A voz de Quinn invadiu seus ouvidos, cuidadosa e um tanto apaixonada.
Rachel saiu de seus devaneios para encontrar um sorriso bondoso de Quinn, que ela jamais tinha visto, em sua direção. Ela confirmou com a cabeça, virando o rosto para que a garota não a visse limpando seus olhos.
— Ok mesmo? — insistiu a garota, pondo a mão no ombro de Rachel. Ela achou o movimento de Quinn carinhoso e pôs sua mão em cima da dela, demonstrando apoio.
— Só estou cansada. E dolorida — acrescentou, fazendo Santana, que prestava atenção na conversa das duas, rir.
— Também pudera, você esteve anos em coma — disse.
Rachel arregalou os olhos. Quinn lançou um olhar mortal a Santana, que continuou com aquele riso zombeteiro dela na cara e que Rachel conhecia tão bem.
Suas entranhas pesavam ao perceber o que estava acontecendo consigo. Ela entrara em coma. Por alguma coisa, alguma queda, algum acidente que poderia ter sido fatal, mas não foi. Ela ficara tempos no hospital enquanto os walkers dominavam o planeta Terra de alguma forma ainda inexplicável. Seus pais quiseram levá-la, porém Quinn disse que cuidaria dela.
E ela cuidou. Tratou bem Rachel até a situação sair do controle, e ter sido obrigada a tentar uma última tentativa de acordá-la. Dando certo, arrumou tudo para ir embora e encontrar Sam e sua gangue.
O que Rachel não entendia — mais do que seus pais terem fugido sem ela, mais do que não se lembrar do acidente ou das coisas o antecederam — era como ela tinha conseguido ouvir a voz de Quinn no dia anterior, tão pedinte e desesperada. Ela simplesmente não pôde agüentar ouvir a garota daquela maneira, queria levantar e fazer Quinn sentir-se bem, ficar feliz por vê-la outra vez.
Quinn era quem mais aparecia em seus sonhos durante o coma. Sequer sabia que estava naquele estado, sequer sabia o que a tinha levado a ficar naquela situação, mas Quinn estava lá sempre. Seja durante algo completamente maluco como vigiar a porta de um teatro da Broadway para que ela se apresentasse sozinha nele ou relembrando um dos pequenos momentos que já tinham tido. Quinn era presença constante neles, mais do que seus pais ou Finn ou qualquer pessoa com quem se importava.
— Santana! — exclamou Quinn indignada, passando o braço inconscientemente pelos ombros de Rachel. A garota deu um sorriso mínimo e não se importou. — Pode fazer o favor de apenas dirigir?! Está assustando Rachel!
Quinn sorriu para ela novamente daquela forma carinhosa. Rachel tentava digerir que, por trás daquela garota mandona e forte com um visual muito bizarro, existia uma menina doce e agradável. Ela gostava daquilo.
— Você não se lembra de nada? — questionou Quinn um tempo depois, quando Santana estava distraída com a música e cantava com Brittany, animada. O tom dela estava esperançoso demais, Rachel notou. — Antes do acidente... De nada?
— Não lembro nem por que eu entrei em coma — respondeu Rachel, deixando a cabeça cair no ombro de Quinn, olhando-a sem emoção. — Quero dizer, eu só senti que precisava acordar ao ouvir sua voz, só isso. E agora estou aqui.
Ela não deixou escapar o tom amargurado. O mundo que queria permanecia entalado na garganta. A percepção cada vez mais viva de que tudo nunca voltaria ao normal continuava a fazer seu coração e sua alma doer.
— Nós vamos dar um jeito, Rachel — Quinn disse ao apertar seu ombro delicadamente. — Vamos sobreviver a este inferno, acredite.
Rachel acreditou.
***
14 de Março de 2012
Schnebly Road, Xenia, OH
10:20 AM
Santana sabia que deveria sentir pena de Rachel por ela ter sido jogada naquele ataque insano e cada vez mais presente dos walkers, mas ela não conseguia. Sua personalidade forte e durona não era compatível com uma Berry, a garota era frágil demais, artística demais para ela.
Quinn, por outro lado, adorava a imagem delicada de Rachel. Santana tinha certeza de que sua melhor amiga havia se apaixonado pelo hobbit antes mesmo de ela mesma perceber isso. Mas Quinn tinha perdido tempo demais procurando o sentido da sua vida enquanto Rachel se aproximava cada vez mais de Finn e pensava que ela era má.
Disso Santana sentia pena. Por que Quinn tinha tido todas as oportunidades do mundo para fazer um novo dia melhor para ela e Rachel, só não tivera coragem. Ficara presa no estereótipo de uma sociedade prestes a entrar em colapso. Agora que tudo fora pelos ares, ela esperava o melhor para Quinn — e o melhor dela era apenas perto de Rachel.
De qualquer maneira, ela deu um sorriso mínimo ao observar as duas no banco de trás do carro velho de Quinn. Rachel (que ainda parecia doente, mas felizmente consciente de tudo que acontecia ao seu redor) deitava no colo de Quinn, enquanto a outra acariciava seus cabelos negros descontraidamente, parecendo lembrar à Santana aquela garota loira e certinha de poucos meses antes.
O fato de Rachel não se lembrar de nada do que tinha acontecido com ela preocupava Santana. Não por ela, já que não tinha nada a ver com aquela novela, e sim por causa de Quinn. Tinha trabalhado duro para poder ser vista como outra pessoa — uma pessoa melhor — para Rachel, que para Santana, vê-la desmoronar após o ocorrido e todas as transformações na sociedade era um tanto torturador.
— Britt, informações — pediu Quinn uns minutos mais tarde, ainda olhando para Rachel apaixonadamente.
Santana deu um olhar rápido à Brittany. A loira sorriu para ela, e a garota achou que poderia enfrentar um milhão de walkers naquele dia. Brittany era a melhor coisa que a sua vida miserável em Lima Heights poderia ter lhe dado. Ela era linda, inocente, a coisa mais pura e sensível dentro do mundo de merda em que se encontravam. Brittany era perfeita para ela, a garota mais inteligente do mundo.
— Estamos perto de Spring Valley — disse Brittany olhando o GPS, também verificando num mapa. — Santana, eu vou te dar o comando para nós não irmos pelas rodovias principais.
Aquela idéia genial tinha sido de Quinn, durante a arrumação para a fuga. De acordo com ela, seria mais fácil e teria menos trânsito se fossem por áreas suburbanas. Quanto menos interestaduais pegassem, melhor. Não enfrentariam walkers ou pessoas desesperadas em busca de ajuda.
Embora Santana não concordasse com Quinn, tinha que obedecê-la. Ela não gostava de ser comandada, mas Quinn e sua aura poderosa desde os tempos de Cheerios lideravam cada lugar que passavam. Seria quase impossível bater de frente com ela.
Quinn tinha o faro para aquelas coisas, algo que Santana jamais teria. Ela poderia ter crescido numa região não muito favorável de Lima, ter descoberto que seu nome verdadeiro era Santana aos seis anos de idade e ter arranjado encrenca com qualquer pessoa que se metesse com suas amigas e Brittany, mas Quinn possuía uma coisa muito mais que isso.
Ela transbordava poder. Olhar nos olhos da garota punk que ela havia se tornado — sem conhecê-la por muito tempo — poderia ser fatal. Santana e os sobreviventes do Glee sabiam o que ela era de verdade: uma pessoa doce e amável. Mas você não deveria se meter no caminho de Quinn Fabray sem esperar nada além do sofrimento eterno.
— Próxima parada? — perguntou Quinn, atenta.
— Daqui a cem quilômetros, o que deve levar uma hora mais ou menos — informou Brittany, diminuindo o volume do rock que Santana havia deixado tocar.
Brittany permaneceu quieta. Santana desviou o olhar por um segundo da estrada para observá-la. Todos poderiam achá-la uma vadia, mas quando se tratava da namorada, Santana sabia ser a pessoa mais meiga do mundo. Ela conhecia cada detalhe de Brittany, tanto corporal quanto psicológico, e aquela garota ao seu lado estava escondendo alguma coisa, sentia.
— O que foi? — questionou Santana, dando um sorrisinho de lado para a loira.
— Nada — Brittany respondeu, os olhos perturbados vidrados na janela do carro. — Vire ali, ok?
Santana fez o que a garota pedia, indo parar numa estradinha de terra com um engarrafamento. Ela ergueu os olhos para Quinn, que fez uma expressão confusa e mandou Rachel levantar de seu colo. Ela e Santana se entreolharam, decidindo silenciosamente o que deveriam fazer.
— Não está andando — observou Santana, colocando a cabeça para fora do Cadillac, vendo alguns carros com aparência abandonada no percurso. — Vamos dar meia volta, achar outro caminho.
Ela pisou na marcha ré, porém antes que o carro voltasse a andar, um walker apareceu misteriosamente no capô do Cadillac, fazendo Rachel dar um grito assustado e Brittany rapidamente sacar sua pistola. Ela ignorou as ordens de Quinn sobre não atacar um zumbi com uma arma de fogo e deu um tiro certeiro na cabeça do morto-vivo.
Como se tivessem dormindo, mais walkers saíram de seus esconderijos e caminhavam de sua forma lenta, porém perigosa, em direção ao Cadillac. Santana não hesitou em enfiar completamente o pé no pedal e sair da estradinha de terra cantando pneus.
— Espere! — gritou Quinn quando Santana mudou a marcha para acelerar o carro.
— Quinn, ficou maluca, estamos no meio de algo aqui! — revidou a morena também aos gritos, irritada com a atitude nada maligna da amiga naquele momento.
— Não, Santana, olhe!
Santana fechou o vidro da sua janela e aconselhou a Brittany fazer o mesmo. Ela lançou um olhar temeroso à massa de zumbis que saía da estrada, liderados por dois extremamente bem arrumados para serem walkers. Em sua forma humana, eles deveriam ter sido gays ou...
O coração da garota parou por um segundo. Ela reconhecia a gravata de um deles. Conhecia o blazer rasgado dele. Reconheceu as botas desbotadas que o outro estava usando. Percebeu até os poucos tufos de cabelo engomado que os dois usavam. Ela comprimiu os lábios, controlando suas lágrimas.
Kurt e Blaine.
Aqueles eram Kurt e Blaine.
Mas não pareciam em nada os garotos que Santana conhecia. A pele deles estava sem cor, magra e faltando em vários lugares, onde era visível a carne, inclusive os ossos. Os olhos fundos e vermelhos estavam famintos e a boca pingava sangue, dando a impressão que eles tinham acabado de se alimentar.
No entanto, walkers jamais estavam completamente satisfeitos. Eles seguiam na direção do Cadillac, gemendo e urrando como animais, à procura de mais comida, de humanos novinhos em folha para se tornarem mais deles.
Ela ouviu Brittany gritando no seu ouvido para que acelerasse o Cadillac, mas ela não conseguiu. Não poderia deixar Kurt e Blaine — os zumbis Kurt e Blaine, tinha de se lembrar — ali. Não, seria errado. Já havia passado por isso com Tina, Mike e Artie, ela não queria ver as pessoas que mais amava no mundo sofrer terrivelmente. Não queria vê-las mortas.
Então, pegou a pistola que Brittany ainda segurava e desceu o vidro do carro. Sua mira melhorara muito durante as semanas que se passavam. Duas balas bastaram para tirar Kurt e Blaine em definitivo daquele mundo apocalíptico. Pisou no acelerador, atropelando vários walkers enquanto as lágrimas desciam sem controle.