Capitulo 1 - Um Descalço, um de Terno e um de Chinelo.
Estava numa sala pouco iluminada pela noite, três grandes amigos, um descalço, um de terno e um de chinelo. Jogavam conversa fora, tomavam cervejas – ainda que escondidos já que estavam na casa dos pais de um deles, e tinham a sensação de estarem esquecendo-se de algo. Os três sentados, olhando uma televisão pendurada no teto, pensavam em como a vida era linstre (uma mistura de linda e triste). O mais velho deles, o anfitrião, estava sentado num colchão ao chão. Era também o mais alegre, ou demonstrava e gostava de ser, o mais forte, sábio e constante. Era o mais dos menos – vivia e já tinha vivido muito mais do que queria. Afinal sentados no sofá estavam os outros dois, D’javu e D’javi. Pensavam parecidos, mas um estava de terno e o outro de chinelo. Viviam vidas bem distintas, mas eram dois muito parecidos pois sofriam e entendiam do mesmo, e compartilhavam de parecidas idas e vindas.
- Pega o controle e muda de canal, vamos assistir a um filme. – Agitava uma nova proposta do que fazer ali, o descalço.
- Que tipo de filme? – Perguntou quase que imediatamente o de chinelo, já segurando o controle – E em que canal?
- Vamos, bota no Multishow! – Sugeriu em bom tom, o descalço.
Enquanto escolhiam a programação, o de terno pensava no tipo de situação que o conteúdo daquele canal traria consigo. “Essa hora nesse canal só deve passar putaria, se for por isso, devo procurar algo melhor na internet”, pensou. A tela da televisão assim que mudara o canal, passou a exibir um programa um tanto esquisito para se assistir entre amigos e enquanto isso, o de terno fora para um canto da sala onde se encontrava um computador e começou sua busca atrás de um filme (não muito diferente da cena que ele já esperava da televisão). Garotas seminuas dançavam em postes de pole dance, assim como algumas mostravam os seios a homens dentro de uma boate. Não era um filme, não tinha história e estava desinteressante. A não ser para o de chinelo, que observava compenetrado e ria, como se aquilo fosse uma piada. O riso dele causou o riso dos demais. Gargalhadas pela cena que a televisão exibia preenchiam o silencio que rondava o restante dos cômodos da casa – O que acabou por irritar uma das irmãs do anfitrião, que saiu do seu quarto, que ficava no segundo andar da casa e lhe impôs irritadiça diante a situação que a desagradava.
- Não querendo ser chata, mas vocês poderiam diminuir um pouco o volume da algazarra de vocês? – Disse nem um pouco grosseira, ao contrário, educadamente, mas fora ignorada e teve de apelar – Bom, façam como quiser, já estamos sendo bastante legais por termos prometido não contar isso pro pai e pra mãe.
Assim, mesmo que o anfitrião não quisesse prender os extintos de seus amigos, era impossível que não sucumbisse ao pedido da irmã. Cessaram-se os risos, mas diferentemente, começaram a rir com gemidos. A situação estranha se estendeu, mas não fora evitada e sim atiçada com um chamado eufórico do que estava de terno – Ei, eu prefiro um filme assim. Uma cena um tanto quanto sem graça para um não presente, mas gostaram os três do que viram e deixaram de prestar atenção na televisão e voltaram-se ao computador. Deixara o filme no mudo, pois era o mais sensato para o de terno. Um escritório, dois homens e uma cena carnal começava. Os três gostavam do que viam, mas desagradava muito a quem não estava ali. Até que resolveram achar que aquilo não era algo legal, pois estava começando a incomodar a eles mesmos. Resolveu então o de chinelo empurrar o de terno e expulsá-lo do computador, e colocou musica, deixando o volume baixo, mas audível.
Dessa vez, a musica agradava a quem não estava ali. Os três sentaram-se sobre o colchão e refletiram dentre alguns minutos, e logo estavam pensando em seus problemas.
- Todos meus irmãos... – Começava a discursar o de chinelo – Todos eles serão padrinhos do casamento e eu não – Segurou o choro, mas não conteve as palavras – E o pior de tudo, minha mãe não está nem aí pra nada, isso me irrita, ela me irrita, aquele namorado dela ridículo...
Quem estava de fora pensaria em falar “Se acalme, mesmo parecendo monstruosidade dela, mãe é mãe”. Típica fala de um ignorante, mudo, de uma escória. E se ainda podia parecer pior para quem não estava, o de terno deprimiu-se (não como um depressivo, ou talvez sim pois quem não estava ali não sabe de nada, pois para quem não estava era uma leva de motivos não entendidos) e deprimiu-se por ajuda de quem não estava ali (ironicamente, quem não estava ali parecia desagradar, mesmo não estando ali). Este de terno chorou, não era forte para isso, fraco para o choro e desencadeou o choro do que estava de chinelo, seu muito semelhante. Mas quem não estava ali, cansado, não choraria e nem mesmo o descalço chorou. E assim se passaram, talvez para quem não estava ali, algumas horas acordado. Mas quem não estava ali, uma hora teria de ir prali.
- Bom, eu tenho de ir trabalhar, você pode abrir a porta – Era uma voz ainda não ouvida, não estava ali antes, mas era conhecida – Eu não queria, mas já vou ter de ir – E ainda agia como se estivesse ali a um tempo, mas ele sabia que não estava (realmente não estava).
- Ah, mas já vai? – Reclamava o anfitrião descalço – Volte outro dia também, precisamos nos ver mais.
Os outros dois não viram, não ouviram, afinal, acabara de chegar e estava na porta, mas já estava de saída também. E quem não estava ali saiu, voltou pra casa e prali ainda não voltou.