Ben Ikneg escreveu: Deveria a sociedade manter o sistema de herança, que perpetua desigualdades, ou seria mais justo abolir a transmissão de bens para promover uma distribuição mais equitativa de recursos e oportunidades? Essa prática fortalece privilégios ou é um direito justo e legítimo? Como poderíamos equilibrar justiça e liberdade?
Isso só pode ser respondido com um textão.
O sistema de heranças ou qualquer análogo não tem relação com a
desigualidade social, a desigualdade social é unicamente baseada na desigualdade entre os individuos. Se amanhã todas as pessoas se tornassem socialmente equivalentes, na semana seguinte você já teria um nível de desigualdade equivalente ao das primeiras sociedades, no mês seguinte ao das primeiras civilizações e no ano seguinte o nível da sociedade atual.
Uma observação, a distribuição de recursos dentro das sociedade sempre se mantém em um padrão estável próximo a distribuição de Pareto, 20% dos individuos ficam com 80% dos recursos. O que ocorre e que quanto maior a quantidade de recurso disponivel, maior essa distorção aparenta ser, considere o cenário onde 10 pessoas dividem maçãs, o primeiro grupo é o grupo dos ricos e é composto por dois individuos, o resto são os pobres.
No primeiro cenário elas precisam dividir 10 maçãs, o grupo dos ricos fica com 8 maças e o dos pobres com 2 maças. Já é uma desigualdade bem grande, os ricos ficam com 4 maças cada um e os pobres com 1/4, mas compare com o segundo cenário onde há 100 maçãs a serem divididas: os ricos ficam com 800, 400 maçãs para cada um, uma quantidade absurda, enquanto os pobres ficam com 50 uma quantidade que pode ser considerada razoavel.
Um sistema baseado na
equidade, como propõem aqueles que tem como base medidas como o fim da herança, ou um imposto muito alto sobre herança, simplesmente criaria uma igualdade restrita e artificial, já que é baseado em tentar cobrir as desigualdades naturais
"tirando dos ricos e dando para os pobres". Isso nunca dará certo e é um sistema insustentavel, para sair de questões ideólogicas não precisa pensar nem uma aplicação nos moldes de Esquerda à lá
Comunismo, onde a Ditadura proleatária cria uma equidade através da coerção. Mesmo pensando em uma lógica cristã onde os ricos decidem doar tudo o que dentém para os pobres de forma que todos tenham a mesma quantidade de recursos e seja o minimo para todos viverem bem, isso nunca será sustentavel.
Por que? A maior herança que os pais deixam não são os bens, são exatamente as capacidades das quais se deriva a desigualdade.
Dentro da minha família extendida eu sou o único que já conseguiu se formar em um colégio prestigiado e passar para um curso disputado em uma universidade conceituada, e isso não se deve aos bens dos meus pais
(até porque eles não tem) ou o fato de eu ter nascido em uma família de classe média, posso constantá-lo olhando para as pessoas ao meu redor, se deve ao fato deu ter nascido filho de duas pessoas que, apesar de virem de famílias muito pobres, tem uma capacidade intelectual muito acima da média: gostam de aprender, respeitam a leitura, discutem a realidade abertamente, consomem entreterimento de forma crítica e principalmente respeitam a educação como única forma de ascenção social, pois foi assim que eles ascenderam.
Eu tive a sorte de ter herdado tal capacidade intelectual e a vantagem de cultivá-la em um ambiente rico em ótimos estimulos, ambos herança dos meus pais. Obvio que a herança monetária faz muita diferença para qualquer individuo, mas no fim, ela é superficial na maioria dos casos.
A maioria dos herdeiros da elite não é Chiquinho Milionário que gasta R$1 milhão por mês com pó e maconha e sonha em ser DJ de pen drive, assim como a massa dos estratos sociais mais baixos não é o Zézinho Estudioso que gasta os R$100 que ele conseguiu vendendo bala com livros usados para conseguir passar na FUVEST.
Se todos fossem colocados em condições equivalentes amanhã, o filho da elite com seu diploma da USP, MBA de Havard, fluente em três linguas, que estudou em colégio de rico, filho de pais muito provavelmente intelectualmente muito superiores e que foi criado em um ambiente estimulante, com briquendos, livros, professor particular e afins, voltará a ser mais rico do que 80% da população no mês seguinte.
"Ah mas se você der educação isso vai mudar no longo prazo!", Não, não vai.
Eu estudei a minha vida inteira até o Ensino Médio em um colégio respeitado da minha cidade, no meu ano eram duas turmas de pelo menos uns 20 alunos, desse total, contando comigo, apenas 5 chegaram ao Ensino Superior ou conseguiram fazer o EM no colégio que eu consegui, e os que não chegaram não foram porque conseguiram ótimos empregos sem diploma, mais, muitas dessas crianças eram crianças que os pais pagavam professores particulares e faziam aulas extras, mesmo assim elas nunca superaram as dificuldades que eu, sendo um aluno displicente, nunca nem senti. Eu não posso afirmar com certeza, mas muito provavelmente porque eu nasci na família certa e no lugar certo, e aqui nós já estamos falando de um conjunto filtrado de pessoas (era um colégio católico da classe média). Mais, todos os cincos que conseguiram se tornarem, em termos toscos, "alguém na vida" são do mesmo grupo de amigos, isso não é coincidência.
Meus pais não receberam boa educação
(para os padrões da época), não são filhos de pais especialmente inteligentes, mas por exemplo, a minha avó e as minhas tias nunca brigaram com a minha mãe por ser uma garota que gostava de estudar, sempre foi um motivo de orgulho.
Eles não cresceram em um ambiente muito bom (meu pai cresceu em um ambiente péssimo), a cidade ainda estava se urbanizando
porcamente quando eles eram crianças, mas não tinha que conviver com um parente agressivo que espancava eles e gastava o dinheiro da família com bebida e drogas.
Talvez se tivessem nascido em uma sociedade equitativa, tivessem alcançado um status social muito superior, ou talvez não se esforçassem tanto já que fizeram isso para sair da situação em que estavam. Porém uma coisa é certeza, meus tios que nunca quiseram nada com nada mesmo recebendo todas as oportunidades e recursos, com certeza não estariam em uma situação melhor em uma sociedade mais equitativa.
Resumindo, a desigualidade não é baseada apenas na diferença de recursos, das raízes dela essa é a mais superficial, a genética, a família em que uma pessoa nasce, o local em que ela nasce, os estimulos que ela recebe durante o desenvolvimento, as pessoas com quem ela convive, a educação que ela recebe, qual educação ela recebe, a personalidade dela, tudo isso contribui para a desiguldade individual que não é pequena o suficiente para ser apagada por mera transferência de renda.
Isso excluindo a visão do Lobão que a majoritária na sociedade e outros problemas laterais.