[Ithil'thol] Nocturne of Truth and Illusions

Diante da cena do crime, o vinho certamente era um método de queima de arquivo. Estava claro que o role-play das peças ali não estava muito preciso. Leonard não se recordava de ter anunciado a hora da morte do velho com sua peça para as demais. Por isso, a ideia de usar vinho para dificultar a estimativa de hora da morte só podia ser coisa de Nathnaught. Ela devia ter influenciado a peça do assassino de alguma forma para dificultar para o Leo original investigar. Mas, bem, não é como se interferência dela no jogo não fosse novidade. Aliás, essa parecia ser a premissa básica do jogo.

Outro argumento que corroborava o uso intencional do vinho para queima de arquivo era a falta de pegadas. As garrafas não tinham caído por conta de um embate. Não, pelo contrário. Após a morte das meninas, o assassino deveria ter sacado a garrafa no compartimento ao lado, esvaziado-a com cuidado sobre as lesões das meninas e, por consequência deixado escorrer pelo chão. Nesse momento, era questão apenas de esticar o corpo para frente, tomando cuidado para que o vinho, altamente manchante, não encostasse nos seus pés enquanto se esparramava pelo chão. Empreitada que o inimigo claramente obteve sucesso, visto que aparentemente não tinha precisado limpar nada, nem no chão e nem em seus calçados. As 5 garrafas quebradas seguintes eram fáceis de entender: depois que a poça da primeira garrafa já teria se espalhado, mas não dominado a sala, ele teria que arremessar as demais a distância, aumentando a poça. Ou pelo menos, deveria ser isso que a GM queria que ele pensasse.

Sabendo que ele tinha pegado 2 das 9 garrafas consumidas ou desaparecidas, o alagamento da adega parecia ser exagerado demais para 6 ou 7 garrafas. Na realidade, o oposto devia ter acontecido: as 5 garrafas deveriam ter caído em detrimento de alguma luta ou desespero das garotas. O assassino, então, deveria ter sacado a 6ª ao lado de eva e a esvaziado sobre suas feridas, devolvendo-a no lugar, sabe-se lá o porquê. No entanto, isso teria deixado pegadas no chão e, para tanto, Nathnaught deveria ter multiplicado o volume de vinho para apagar as pegadas ou eventuais marcas de luta no chão. Ou isso, ou o compartimento secreto de Lin era grande o suficiente para o sujeito conseguir a quantidade de vinho necessária, já que ele tinha a chave mestra de Lin. Só que isso parecia complicado demais. Fosse o caso, era muito mais fácil só pegar o vinho de mais fácil acesso e jogar ou esvaziar mais garrafas a distância.

Bem, poderiam ser só essas duas hipóteses se não fosse pelo nível de influência da GM. Ela não precisava se limitar a apenas multiplicar o volume do vinho. Afinal, ela podia controlar todo o modus operandi do assassino. Sendo assim, o culpado podia muito bem ter tomado a primeira via mais cautelosa e, então, vendo que não era suficiente, aumentado o volume de vinho. Tudo isso para não ter que ir até a Mud Room para se limpar e limpar os rastros deixados no caminho. Não era um percurso tão grande, uma sala estava pertinho da outra. Mas o tempo que se levaria para ir até lá, se limpar e voltar limpando o chão e, depois, se livrar dos utensílios de limpeza poderia ser um risco bem significativo a se correr.

A terceira hipótese parecia mais plausível, mas nem por isso deixaria de investigar. Por mais que ele tomasse cuidado ao despejar vinho, respingos ainda poderiam acontecer nas roupas. Ou então, por mais que ele tentasse limpar o chão, coisas de tecido, como carpetes, não seriam tão facilmente limpos. Não teria tempo para lavar essas coisas além de apagar os rastros.

Bem, para isso, prosseguiria ordenando sua peça para observar bem as roupas de todos os presentes. Procuraria sinais de respingos de vinho. Além disso, também daria uma olhada no carpete no centro do Hall 1. Então, pedindo para que os demais lhe acompanhassem, seguiria olhando o Mud Hall, a lavanderia e o Mud Room. Buscaria sinais de manchas de vinho que o culpado pudesse ter deixado para trás. Ou então, sinais de que o local havia sido mexido recentemente, como poças d’água ou gotas que não tinham secado.

Após isso, explicaria que teria feito aquilo só para que ninguém achasse que ele teria ido até lá apagar eventuais pistas. No entanto, na realidade, aquela jogada também serviria para ter a oportunidade de comparar as dimensões de partes de seus corpos com eventuais marcas, bem como ter a chance de dar mais uma olhada nas roupas de todos de pontos de vista diferentes.

Então, prosseguiria ordenando que a peça sugerisse que todos novamente fizessem o mesmo depoimento cronológico por escrito simultaneamente. Afinal, assim era mais difícil que uma pessoa mudasse o seu relato após ler o da outra. Ademais, também pediria para que todos tentassem colocar tudo e todos que tivessem visto ou ouvido durante os relatos. Dentro do que conseguiam se lembrar, naturalmente.

Claro, ele também faria o seu. No entanto, para isso, teria que revisitar as memórias da 00:37~00:57~01:07 até o atual momento. Então, ao passo que revisitava os momentos, seguiria escrevendo-os com a sua peça. Até faria questão de rever os atos, pois precisava excluir de fato que tinha perseguido Klaus durante a hora aproximada da morte das meninas. Ele e Nathnaught pareciam ser grandes suspeitos.

Então, pediria para alguém ler os depoimentos em voz alta. Após lerem o de todos e nos depoimentos de Ultred e Eleonora não contivessem nada sobre o som de portas abrindo, perguntaria para eles se não seria o caso de terem ouvido algo e de onde isso teria vindo. Não diria, claro, mas Nikolai ainda podia estar agindo para acobertar seu filho e sendo conivente com seus atos.

Com aquelas informações, avaliaria se conseguiria fazer um chute. Caso achasse que conseguia, anunciaria que iria fazer um. Então, após fazê-lo, passaria sua vez. Caso achasse que não conseguiria fazer um de jeito nenhum, somente passaria a vez.

De qualquer forma, Leo fico satisfeito quando alguns o seguiram e outros não. Na realidade, era até mais conveniente que alguém ficasse tomando conta dos corpos das vítimas. Por isso, nada disse para Eleonor e Ultred. Ademais, a ideia de Klaus também era muito oportuna. Afinal, Ultred e Eleonora poderiam ser as próximas vítimas e, estarem em três garantia menor chance do assassino conseguir vencer uma eventual lutar e matar seus alvos. O meio-termo encontrado acabou servindo para ambas as finalidades. Em resposta a ele, Leonard apenas assentiu com a cabeça.

Quanto à sua vigilância das roupas, pode perceber que todos estavam impecáveis, bem como o ambiente da sala. O que por si só ainda não dizia algo muito específico sobre o howdunit, mas certamente complementaria as próximas descobertas.

Com os indícios de uso recente da lavanderia, porém, Leo pode perceber que o nível de impecabilidade fazia um certo sentido. Não haviam empregados no local há um bom tempo, por isso só um dos herdeiros que poderia ter usado aquela área de serviços recentemente. Algo que cheirava muito a queima de arquivos. Talvez o nível de impecabilidade se devesse a um misto das duas coisas: tanto cautela quanto ao vinho — pelo menos no aspecto das roupas, mas não tanto de pegadas, o que explicaria a interferência no volume de vinho —, quando cautela na limpeza. Ou seja, se tomasse cuidado para não sujar muito e depois passasse limpando, os efeitos seriam muito mais convincentes.

As peças de roupas indistinguíveis não o surpreendiam, porém. Não era incomum possuir peças de roupas repetidas. Ainda mais quando se está planejando assassinatos. Era questão de, com alguns dias de antecedência, comprar roupas iguais para servirem de trocas. Já os indícios de água na janela deixavam mais forte ainda os tais indícios de queima de arquivo. Talvez o assassino não tivesse se livrado das roupas com sangue, pois seria fácil identificar a quem elas pertenciam, mas talvez ele tivesse descartado expurgos, sujeira suspeita ou utensílios marcados? Difícil de saber, já que não dava para averiguar nada do lado de fora a princípio.

Após ler todos os depoimentos, inclusive o próprio, Leonard acreditou chegar a um veredito razoavelmente confiável. Como tinha vigiado Klaus, seu álibi estava sólido e, portanto, ele não deveria ser o culpado. Isso deixava apenas Momochi e Nathnaught para trás.

Como Reinhardt bem lembrava, no xadrez existia um movimento especial muito caracteristico no qual o jogador cerca o próprio rei de peões e uma torre. O famoso roque era muito eficaz como uma proteção para a peça mais importante do jogo, pois reduzia o número de acessos que as peças inimigas poderiam ter ao rei. No entanto, como uma faca de dois gumes, também acabava limitando ainda mais a mobilidade do rei. Não à toa, muitas vezes, muitos cheque-mates eram atingidos graças ao encurralamento causado pelas próprias peças do inimigo em situações de roque.

Leo era bastante racional, claro, mas nem por isso deixava seu lado intuitivo de lado. E, nesse caso, era exatamente essa senção que a situação de Momochi, Nikolai, Nathnaught, Dusk e Sephie passavam. Com o diferencial que, claro, naquela situação a game master tinha conseguido um segundo roque para servir de chamariz. De fato, uma estratégia que seria superior ao roque comum no xadrez, se fosse possível. Assim, o inimigo teria que dividir suas forças para tentar determinar qual era o rei real a ser encurralado.

Todavia, havia uma diferença fundamental entre os dois tipos de roques. Talvez porque a Game Master não deveria conseguir perverter tanto assim a lógica por trás das personalidades das peças, o roque de Momochi e Nikolai fazia muito mais sentido no sentido puramente defensivo. Claro, eles não pareciam lembrar-se da posse da chave mestra e, por isso, acabaram apenas encurralando a si próprios, já que o inimigo tinha acesso livre ao interior da sua proteção independente das portas trancadas que tinham armado como obstáculo.

Nathnaught, Dusk e Sephie, pelo contrário, estavam sob o efeito de um roque de intuito completamente diferente. Ele não era nem um pouco defensivo: estarem bêbadas apenas as deixava muito mais desprotegidas contra o ataque de um assassino. Não, o roque ali parecia ser mais uma proteção informacional do que qualquer coisa. Afinal, sua verdade azul posterior, a princípio, impedia que as meninas (em sua maioria inocente) mentissem e, por tanto, acabassem criando uma contradição óbvia em relação ao depoimento do assassino, o único permitido a mentir. No entanto, com a adição da bebida, essa linha tornava-se borrada e Leo não teria como saber quem estava mentindo ou errando. Não fosse por esse roque tão displicente quanto ao senso de autopreservação das peças — como se a prioridade por trás de suas ações fosse outra completamente diferente —, talvez Leo ainda estivesse confuso quanto aos dois possíveis agentes culpados.

Graças à natureza da teoria dos jogos por trás de movimentos similares ao roque, o espectro de suspeitos havia reduzido bastante. Afinal, se as garotas não tivessem o potencial de produzir um testemunho verdadeiro e incriminador quanto ao culpado, não teria porque embebedá-las para prejudicar a verdade azul. Claro, bêbados sem o potencial de produzir um testemunho verdadeiro e incriminador ainda se classificariam como um chamariz para Leo. No entanto, de nada adiantava se as peças próximas ao culpado não estivessem bêbadas. Ou seja, a princípio, o caçador acreditava que ou o culpado embebedaria apenas indivíduos perigosos, ou o culpado embebedar todas as peças.

Por fim, um último fator era o ato de embebedar a peça culpada. Algo que podia parecer inútil a princípio, já que esta já era livre para mentir de qualquer forma. Mas que, na realidade, indicava uma certa tentativa de camuflagem. Ou seja, não só era um roque, como era um roque no qual não se era possível distinguir quais as peças protegidas ao centro das estreitas muralhas do castelo. Houvessem múltiplas tentativas de camuflagem, Leo até poderia ter ficado confuso. No entanto, camuflar apenas um local assim era bastante suspeito. Ou seja, significava que havia algo escondido ali, por mais que ainda não conseguisse distinguir o que.

Conforme suas contas, Leo e Klaus saíram da sala às 01:05, enquanto Eva saiu do Guest 2 às 01:00. O fato de Leo e Klaus não terem a encontrado no meio do caminho significava que ela só poderia ter efetuado um desvio. No entanto, julgava que talvez não fosse tão estranho assim, vocalizar que queria ir até a sala de mídia e, então, realizar um breve desvio. Ela poderia ter sido atraída pelo culpado, mas nesse aspecto algo parecia não fazer sentido. Não só as três bêbadas tinham um álibi, como também Nadine ainda estava viva até esse momento. Algo tinha que ter acontecido para que tanto Nadine quanto Eva acabassem na adega da mansão. Só que parecia difícil de determinar. No intervalo entre 01h05 e 01h10 Nadine teria que ter deixado a sala e ido atrás de sua irmã, Eva. Fosse Nathnaught a culpada, ela teria que ter cometido o ato enquanto Dusk e Sephie estavam desacordadas pelo sono característico da bebedeira e retornado em 5 minutos. O problema que Leo encontrava nessa teoria era o fato dela ter conseguido apagar seus rastros em tão pouco tempo.

Considerando que Ultred e Eleonora não ficaram muito tempo nos Halls da mansão durante esse período, talvez ela pudesse ter cometido o ato, trancado a porta e só então prosseguido com a queima de arquivos. Isso se os indícios de uso da lavanderia realmente fossem tão incriminatórios assim. Afinal, de fato ela teria sujado suas roupas há algum tempo com as bebidas na Guest 1 antes do assassinato de Lin.

Àquela altura, Leo estava genuinamente inclinado a colocar, pelo menos, Vladimir na lista de suspeitos. Afinal, era o único sem álibi confirmável durante aqueles minutos fatídicos. Poderia muito bem ter atraído as meninas, aproveitando que as três bêbadas quase desmaiadas não se lembrariam dele ali. A maior questão era o seu howdunit quanto ao assassinato de Lin. Se após às 00h20 ele esteve na Guest 2 com Nikolai, Vladimir, Eleonora e Ultred ele não poderia ter se ausentado por alguns minutos para ir até a cozinha, matar Lin, trancar tudo e retornar sem isso constar no relato dos outros três membros sêniores da família.

Finalmente, então, decidiu passar a vez. Nath o fez com uma expressão não muito bonita na cara, o que, naturalmente, chamou a atenção do spades. Claro, não tinha como ler a mente dela, mas como sabia da existência de uma série de atores no mundo real, supunha que alguma coisa desagradável deveria estar acontecendo do lado de fora. Administrar sua dimensão pessoal e o desenrolar dos fatos do lado de fora não deveria ser fácil, afinal.

Ademais, a morte das peças de Nikolai e Momochi em apenas 20 minutos certamente deveria ser bastante incriminatória. No entanto, sem sequer investigar, só isso já excluía ambos da lista de suspeitos. Principalmente Momochi. Com isso, somando ao Klaus também excluso, mais fortemente ainda as coisas apontavam para Nathnaught. Cruzando a lista de possíveis assassinos para ambos os casos, ela era a única que aparecia duas vezes. E, como a premissa do jogo não era mais de um assassino, Leonard estava bem resoluto de que deveria ser ela. Claro, o assassinato de NadiNe e Eva parecia um tanto improvável da forma como se apresentava: em 5 minutos. Mas, não era impossível.

Aliás, pensando bem, era bem improvável que Nathnaught tivesse conseguido limpar as bebidas derrubadas sem sair do Guest 1. Em algum momento ela teria que ter passado no Mud Hall, Lavanderia e Mud Room para coletar materiais de limpeza. Ademais, como ela não deveria ter como prever o momento exato em que a reunião terminaria, se ela de fato tivesse terminado de limpar às 00:19, a coisa mais lógica era retornar os materiais de limpeza para as salas conectadas ao Mud Hall. Seria só a partir das 00:20 que ela poderia ter escutado os outros membros sêniores saírem da reunião, marcando o seu fim.

A partir desse momento, porém, os detalhes eram um pouco mais difíceis de definir. Era possível que ela tivesse retornado de fininho até a Guest 1 antes da 00:21 para que Lin e Leonard não a encontrassem no corredor. No entanto, também era provável que ela houvesse ficado escondida ali, esperando Lin passar depois dos seus irmãos. Por conta do encontro de Leo e Lin no Stair Hall, ela teria ficado momentaneamente impossibilitada de cometer o ato naquele instante. Porém, graças à conversa entre os dois, ela acabaria sabendo a exata posição dos dois nos próximos minutos: Lin estaria na cozinha e Leo estaria ocupado na adega.

Sabendo das posições deles, ela só precisaria se esgueirar do Mud Hall ou do Vestibulo 1(o Vest. 1 do Guest 1) até a Long Room e, em seguida, à Cozinha. Lá, ela só precisaria achar uma forma de se aproximar do velho sem ele elevar sua guarda — algo que não deveria ser difícil, já que era da família —, sacar a arma sorrateiramente e surpreendê-lo com uma facada.

Após isso, era só questão de roubar as chaves do corpo sem vida de Lin, trancar as portas e voltar para a Lavanderia para apagar eventuais provas em sua roupa ou ir para o chuveiro para criar um álibi e apagar eventuais provas em seu corpo. Ir direto à Lavanderia, porém, parecia ser provável. Afinal, próximo dali, no Mud Hall, ela poderia encontrar as toalhas que precisaria para ir para o seu banho. Assim, ela poderia lavar as roupas sujas de bebida e sangue na máquina (ou à mão no tanque) e, então, voltar ao Bath 1 enroladinha numa toalha ou algo do tipo. Ainda que fosse pega no meio do caminho, sabia que a explicação de terem derrubado bebida nela tornaria sua volta da lavanderia perfeitamente compreensível.

Era possível que ela fosse do assassinato direto ao banho. No entanto, isso soava um tanto arriscado, pois as roupas do crime poderiam acabar ficando no Bath 1 até que ela fosse liberada após a reunião de emergência das 00:30. Sujeitas a serem encontradas por alguém, ela provavelmente não se submeteria a esse risco. Ou seja, à altura em que ela estava no banho — antes de ser chamada — a máquina de lavar já deveria estar batendo as roupas e os panos usados na limpeza das bebidas. Outra possibilidade seria também que suas roupas já estavam lavadas ou descartadas através das janelas mesmo antes do banho próximo das 00h30.

Indo além, considerando que a roupa de ninguém teria mudado das 0h30 até as 02h00, a hipótese de que ela teria esvaziado as garrafas de vinho com cuidado para não se sujar era bem provável. Todavia, por já estar bêbada à altura do segundo assassinato, talvez a game master tivesse interferido para apagar eventuais pegadas ou coisas do tipo com o alagamento de vinho. Isso significava que ela provavelmente deveria ter deixado pegadas nos halls. No entanto, não era impossível que ela tivesse refeito seu trajeto limpando só pegadas, descartado as coisas pela janela e retornado à sala antes de Ultred e Eleonora aparecerem por lá. Ela não tinha como prever o retorno deles, mas, como tinha duas bêbadas — cujo sono poderia ser inconstante — esperando-lhe na mídia, teria que fazer tudo o mais rápido possível.

De qualquer forma, quanto a essa parte, supunha que não precisava investigar mais. Afinal, a regra era somente desvendar um dos assassinatos.

Respirando fundo, então, anunciou seu chute. Informou a Game Master que achava que a culpada pelos assassinatos era a peça Nathnaught. Ademais, também verbalizou todo o raciocínio e passo a passo feitos há pouco em sua cabeça para honrar o howdunit. Deu foco aos momentos até às 00h30, porém, já que era no primeiro assassinato que ele sentia ter dados mais confiáveis.

Caso estivesse errado, bem, contentar-se-ia com o fato e seguiria com o jogo. Sabendo das novas mortes, então, colocaria a peça para se lembrar exatamente quantas vezes todos tinham se separado e quais eram os grupos de 4 formados para tais ocasiões. Feito isso, iria até a porta da Jr. Suite e bateria, chamando os dois. Não obtendo resposta, avisaria a todos que tinha se lembrou de algo importante. Buscaria ir à frente, sozinho se possível, até a Mud Room. Assim que estivesse em uma situação que os demais não pudessem vê-lo sacando a chave mestra, esconderia-a em seu punho. Chegando à Mud Room, buscando uma gaveta qualquer, cujo ângulo fosse favorecido pela ocultação de seu tronco em relação à quem viesse do Mud Hall, enfiaria a mão com a chave na gaveta e buscaria cuidadosamente fingir que tateou o interior e achou a chave dos servos.

Obtendo sucesso, iria até as portas e destrancaria a Jr. Suite. Lá, começaria a investigar a causa da morte e, também, a hora da morte. Então, tentaria reconstruir a situação que causou a morte. Como estiveram no Hall esse tempo todo, dificilmente alguém poderia ter entrado por ali para matá-los, dessa forma, daria certa prioridade para investigar o trajeto porch > junior master sitting > junior suite > todos os armários e banheiros atrás da porta o jr. vest. Além disso, também daria uma olhada nos consumíveis que ambos haviam levado para dentro do quarto. Faria a checagem com cuidado, claro, já que, dependendo da presença ou não de ferimentos, poderiam estar envenenados.

Enquanto a peça o fizesse o recolhimento da chave conforme instruído, Leonard redigiria duas verdades azuis:

O tabuleiro do jogo pode ser manipulado e alterado para possibilitar averiguar todas as estruturas geradas dentro desta dimensão onde o jogo ocorre, incluindo todas os espaços, ocultos ou não, da mansão e seus arredores.

Devido ao original já conseguir checar as posições de todas as peças, vivas ou mortas, ainda que estas não estejam em locais normalmente cognoscíveis à peça de Leonard, o paradeiro de nenhuma peça pode ser ocultado, ainda que isso signifique estar fora do tabuleiro convencional.

Leonard não só queria sair do espaço por que temia o rumo que as coisas poderiam estar tomando do lado de fora, mas porque também temia pelo seu bem-estar naquele espaço. Tinha alguns meios para contornar a fadiga, pelo menos temporariamente, mas ainda assim estava preocupado com o estado resultante.

Ao ouvir que seu suspeito não era o culpado, porém, ficou bastante intrigado. Claro, preocupou-se ainda mais com o dreno de forças que deveria ter aumentado. Mas, por saber que se entregar ao desespero apenas o condenaria naquele jogo, buscou manter o foco na faceta racional de sua mente. Focando-se puramente no lógico, como costumava fazer em outras ocasiões, talvez conseguisse anestesiar aqueles eventuais empecilhos em seu fluxo de pensamento.

Realmente, com a confirmação de que Nathnaught era inocente, as coisas ficavam um tanto confusas. Klaus, Momochi, Sephie, Dusk, Eleonora, Ultred e ele possuíam fortes álibis para pelo menos um assassinato cada. E, sendo assim, Leonard começava a acreditar que talvez houvesse algo de errado com o jogo em si. Quer tirando aquelas pelas e os mortos…

“Os mortos…” — Leo repetiu mentalmente, contraindo o cenho em estranheza quanto ao insight que tivera.

Quer dizer, Momochi, Vlad, Eva e Nadine obviamente não deveriam ser os assassinos, pois até mesmo seus corpos moribundos tinham álibis. No entanto, havia um indivíduo naquele jogo, supostamente morto até então, que ainda não tinha álibi ali. E esse era Lin. Talvez sua morte na cozinha tivesse sido forjada? Não sabia dizer se o próprio rato havia deitado ali com maquiagem e efeitos especiais ou se o corpo inteiro era um produto de efeitos especiais. A segunda hipótese até parecia crível, possibilitando que algum dos corpos por aí fossem falsos e pertencentes ao assassino. Afinal, morte era o álibi perfeito. No entanto, no fim isso parecia bem mais improvável do que fingir ferimentos mortais em seu próprio corpo. Criar um corpo do zero era algo bastante complicado, principalmente no processo de criação do rosto. Como bem tinha alguma noção, graças às suas perícias no que tangiam a construção de androides, evadir o chamado vale da estranheza era algo um tanto difícil, mesmo para os artistas mais completos. Afinal, uma coisa é desenhar um rosto absolutamente realístico numa tela 2D, capturando apenas um único frame preso no tempo. Outra coisa era mimetizar toda a física complexa os múltiplos músculos presentes na face. Acontecia que, durante o processo evolutivo, sabe-se lá porque, o cérebro acabou ficando insanamente bom em identificar rostos humanos com proporções reais. Era até por isso que a maioria dos efeitos especiais e afins sempre deixavam escapar um quê de estranheza ou anormalidade. Sendo assim, dar-se ao trabalho de falsificar um rosto ainda mais complexo como o de um idoso só para forjar uma morte poderia ser um trabalho e tanto. Por esse ângulo, a hipótese de fingir a morte deitando num local com maquiagem convincente era muito mais plausível. Afinal, esse era um método de cinema que o próprio Lin já tinha usado anteriormente. A única pena ali era saber se o velho original de fato tinha as habilidades de animador ou se aquilo era do feitio de Nathnaught. Algo que, na realidade, talvez não fosse tão difícil, visto que o velho deveria ter sido capturado por ela com sua pesadíssima maquiagem de disfarce.

Ademais, caso o velho quisesse tornar tudo ainda mais crível, bastava ingerir alguma droga para desacelerar drasticamente o coração — ou até parar temporariamente sob algum comando — e se fazer parecer morto. Arriscado, mas definitivamente possível. Não era algo incomum de se ouvir na cultura pop aliás.

Tendo tudo isso em vista, e sabendo que não era médico, Leo começava achar até bem provável que tivesse errado na identificação do corpo. Bem, talvez até ficasse algo difícil porque ele também poderia ter usado sangue real na forja. Só acabou se arrependendo mesmo de não ter puxado a faca do peito do velho. Eventualmente, porém, conformou-se. Considerando o contexto naquele momento, seria bem incriminatório — e até ruim para a cena do crime — se mexesse em algo ali.

De qualquer forma, seguiu investigando suas memórias do último timeskip. A separação de grupos era uma ideia sólida, dada sua verdade azul anterior. No entanto, o sumiço de Sephie no banheiro tinha definitivamente conseguido mexer com ele. Se Nathnaught podia até mesmo criar matéria do nada ali, forçar uma das peças passar mal e vomitar da bebida era algo fácil. Apesar da pobre coitada realmente parecer ter passado mal, Nath tinha sucedido em conseguir plantar uma pequena semente de dúvida quanto a ela na cabeça do caçador.

Ao que a peça obteve sucesso no pequeno teatro, Leonard sentiu-se um pouco aliviado. Assim como tocar na faca, supostamente falsa, aquilo poderia ser bastante incriminador para ele. E, como não sabia se podia ou não ser “ejetado daquela nave, como se fosse um falso impostor”, achou melhor não dar sorte ao azar.

Agora focado na nova cena do crime, percebeu que novamente o método de ocultar a hora da morte tinha sido utilizado. Algo que, pensando agora, era muito suspeito da parte do assassino. O Ás não se lembrava de ter compartilhado em nenhum momento o tempo da morte de Lin. Por isso, estranhou que o assassino tivesse logo tomado suas medidas. Bem, outro ponto na conta do velho: se era ele ou um dummy, ele deveria estar no centro da cena do crime ou oculto em algum compartimento secreto. Portanto, ele poderia muito bem ter visto o loiro fazendo sua análise de camarote. Além disso, esticando mais um pouco, como todos ali tinham álibi, era de se imaginar se esse álibi também não se estendia para o “crime” de ver a peça de Leo analisar o sangue.

De qualquer forma, a cena do crime parecia apontar para a varanda. A Jr. Master Sitting estava mais limpa provavelmente porque o criminoso não deveria “cagar onde comia”. Se ele tinha focado a comida para sujar os corpos e a área que ele queria dar a entender de onde ele tinha vindo, ou se ele tinha se focado mais em limpar o local por onde sairia, Leonard pouco se importava. Pelo menos isso parecia um tanto provável de se afirmar. Ademais, os rastros de água vindos do banheiro pareciam indicar que o sujeito tinha tentado levar água ou algo molhado para ajudar na limpeza da cena do crime. Mas, como a água deveria escorrer por completo, o rastro tendia a apagar quanto mais longe ia. Talvez por isso que a master sitting não estivesse tão molhada. O indício de gotas da porta da master sitting, inclusive, também corroborava para essa ideia.
Sua ideia era seguir o rastro de Lin a partir da cozinha. Mas por supor que precisaria de sentidos mais aguçados ou talvez máquinas, inicialmente desistiu um pouco da ideia. Como tinha as verdades azuis ao seu favor, tentou agilizar o processo com as mesmas.

Torceu a boca, meio desapontado quando sua primeira verdade foi prontamente esmigalhada. No entanto, pelo menos perceber o susto talvez indicasse que estava indo para a direção certa? A segunda verdade, porém, pareceu fazê-la deixar isso um tanto mais claro. Afinal, por que tanta insistência assim em esconder o corpo de Lin? Se o problema fosse identificação de digitais e afins, bastava usar algo para apagar os rastros. Àquela altura o assassino já deveria ter tido tempo de sobra para isso. Por isso, bastava deixar o corpo em qualquer lugar que não faria mais diferença. Quer dizer, pelo que se lembrava, não tinha nada de muito característico no assassinato do velho. Era uma facada simples, uma situação simples, de execução simples — já que não pareceu haver lutas — que não poderia gerar mais do que algumas digitais na faca. Bastava se livrar da faca.

Entretanto, como parecia pior chutar agora e arcar com um possível erro do que simplesmente tentar investigar, Leonard tentou se contentar em não chutar por enquanto. Naturalmente, já tinha um plano em mente. E, considerando as possíveis reações de Nathnaught com seu reality warp, Leo tinha que ser cauteloso quanto a possíveis queimas de arquivo. Por isso, sugeriu reunir todos os familiares restantes para uma breve reunião. Nessa reunião, faria sua peça perguntar se alguém lembrava onde ficava o quarto do vovô, afinal, poderia haver mais pistas ali. Justificaria dizendo que, quem quer que fosse, para ter sumido com o corpo do vovô, deveria ter algo que ele queria especificamente com ele. Finalizaria sugerindo também que, provavelmente por conta de algo de grande valor — ou da chave mestra que garantiria o acesso — ele teria sido o primeiro alvo.

Sugeriria que todos fossem investigar, mas se Ultred e Eleonora se recusassem, sugeriria a mesma divisão de grupos: Vlad, Klaus, Sephie e ele. As razões de manter Sephie deveriam ser bem óbvias. Mas Klaus, talvez não tanto assim. Bem, de qualquer forma, se o que planejasse desse certo, a garota talvez não tivesse tempo para reagir.

Seja memorizando as direções fornecidas por alguém do grupo que iria ficar ou sendo guiado por alguém que soubesse — incluso si mesmo —, Leo tentaria chegar nos aposentos de Lin. Aquela era sua casa, afinal, e não faria um pingo de sentido se algo do gênero não existisse. Caso obtivesse sucesso nessa empreitada, em silêncio começaria a analisar o quarto. Sem dizer nada para ninguém, tentaria localizar qualquer pertence pessoal — fossem roupas, joias, sapatos, etc — que ficasse bastante tempo colado à pele de Lin. Roupas favoritas eram bastante visadas naquele tipo de investigação, por isso manteria em mente ordenar sua peça a pensar em coisas que ele sempre via o velho usando. De preferência, algo que não era frequentemente lavado ou limpo. Roupas sujas deveriam ser o alvo perfeito, mas talvez relógios, sapatos e outros acessórios também valessem.

Caso obtivesse sucesso em encontrar o item que melhor se encaixasse no critério, mentalmente programaria sua peça para sussurrar algo no ouvido de Klaus. Não sabia se Nathnaugh contava como um narrador onisciente ou apenas como um observador como ele — ou seja, alguém que poderia acabar não sabendo de algo a depender do alcance de seus sentidos físicos —, mas apostaria para ver qual das opções era a certa. No pior dos casos, adquiriria mais conhecimentos.

Enquanto sua peça aguardava o sinal para começar os sussurros, Leonard prepararia sua primeira verdade azul:

A ilha em que a mansão se localiza passa por um sério período de estiagem, as chuvas são extremamente improváveis e, mesmo quando acontecem, não passam de chuviscos super ralos, que são praticamente irrelevantes no que tange alterações do ambiente.

A primeira verdade deveria parecer risível a princípio, claro. Todavia, era a intenção de Leonard que o fosse. Dependendo do nível de alerta em que Nath estivesse, talvez ela acabasse perdendo a janela para mudar fatos passados. Por isso, buscando ao máximo manter sua poker face, prosseguiria com suas jogadas.

Mentalmente, prosseguiria formulando sua próxima verdade azul. Assim que estivesse pronto para lançá-la, preparar-se-ia para dar dois comandos um seguido do outro. Imediatamente ao que lançasse a verdade azul ao ambiente, daria o toque de sinal para que sua peça fizesse um pedido sussurrado a Klaus.

— Ehrm… Klaus-kun, não sei se esse é um assunto sensível ou não, mas, bem, dada a situação acho que não temos muitas escolhas — em baixo tom, aproximar-se-ia de um dos ouvidos do irmão. — Você acha que poderia farejar o vovô com isso daqui? — finalizaria, dando-lhe o item que teria coletado há pouco.

A verdade azul que teria submetido pouco antes da peça teria sido a seguinte:

Como é inerente a todos os seres vivos deixar rastros químicos de difícil total erradicação, Klaus, que possui uma herança animal de cães, animais altamente conectados à memória da identidade olfativa de seus entes queridos e/ou matilha, consegue captar e seguir os rastros olfativos deixados por Lin, vivo ou morto.

Caso encontrar um item pessoal de Lin com aqueles critérios, ou sequer encontrar o quarto fosse algo impossível, antes de partirem Leo voltar-se-ia para Ultred e Eleonora. Perguntaria a eles em qual das cadeiras Lin costumava sentar e qual era a última na qual havia sentado na reunião. Não era a situação ideal, mas o assento e o encosto da cadeira, talvez, pudessem bastar. Por isso, no caso de ter que apelar para a cadeira, repetiria o primeiro plano. No entanto, em vez de entregar o item coletado, apontaria para a cadeira a qual tinha sido informado por Eleonora e Ultred. Antes disso, apenas teria um palpite de qual era a cadeira. Mas sabia que, por razões de hierarquia — e até para ficar de um ponto de vista privilegiado na reunião — os patriarcas costumavam sempre sentar na ponta.

Se absolutamente tudo falhasse, contentar-se-ia em voltar para investigar a cozinha. Tentaria encontrar quaisquer rastros nela e, em seguida, na Poarch. Achava improvável, mas achava que não custava tentar pelo menos perguntar em particular se Klaus não conseguiria pegar rastros dali. Afinal, Lin deveria ter ficado parado ali por alguns minutos, deixando seus rastros químicos.